(PUC/MG - 2009)
TRECHO 1
Belo Horizonte, que lindo nome! Fiquei a repeti-lo e a enroscar-me na sua sonoridade. Era longo, sinuoso, tinha de pássaro e sua cauda repetia rimas belas e amenas. Fonte. Monte. Ponte. Era refrescante. Continha fáceis ascensões e aladas evasões. Sugeria associações cheias de nobreza na riqueza das homofonias. Belerofonte. Laocoonte. Caronte. Era bom de repetir – Belorizonte, Belorizonte, Belorizonte – e ir despojando aos poucos a palavra: das arestas de suas consoantes e ir deixando apenas suas vogais ondularem molemente. Belo Horizonte.
Belorizonte, Beoizonte Beoionte. Fui à nossa sala de visitas e apliquei no ouvido a concha mágica que me abria os caminhos da distância. Ouvi seu ruído helênico e o apelo longínquo – beoioooooo – prolongado como silvo dos trens que subiam de Caminho Novo acima, dobrando o canto dos apitos na pauta das noites divididas.
NAVA, Pedro. Balão cativo. Ateliê, 2000. p. 85.
TRECHO 2
Belo Horizonte é hoje para mim uma cidade soterrada. Em vinte anos eliminaram a minha cidade e edificaram uma cidade estranha. Para quem continuou morando lá, a amputação pode ter sido lenta, quase indolor; para mim foi cirurgia de urgência, a prestações, sem a inconsciência do anestésico. Enterraram a minha cidade e muito de mim com ela. Em nome do progresso municipal, enterraram as minhas casas; enterraram os pisos de pedra das minhas ruas; enterraram os meus bares; minhas moças bonitas; meus bondes; minhas livrarias; bancos de praça; folhagens; enterraram-me vivo na cidade morta. Por cima de nós construíram casas modernas, arranha-céus, agências bancárias; pintaram tudo, deceparam as árvores, demoliram, mudaram fachadas, acrescentaram varandas, disfarçaram de novas as casas velhas, muraram o espaço livre, reviraram jardins, mexeram por toda a parte com uma sanha cruenta. Como se tivessem o propósito de desorientar-me, de destruir tudo que me estendia uma ponte entre o que sou e o que fui. Ai, Belo Horizonte!
TRECHO 3
Dessas marchas a pé havia uma que eu fazia com prazer. Era a da noite, indo para casa. Sempre só, seguia Afonso Pena pela beirada perfumosa do Parque ou pelo passeio fronteiro. Passava pela esquina de Seu Artur Haas e logo depois era um muro imenso até as paredes em construção da Delegacia Fiscal. Novo terreno baldio (ainda não havia Automóvel Clube). Depois era o Palácio da Justiça todo negro e fechado. Vinham as casas seguintes: A do Doutor Rodolfo Jacob; depois a deliciosa edificação em que residiriam sucessivamente o Dr. Francisco Peixoto, o Dr. Bolivar, a Dona Alice Neves, a quase igual do Dr. Balena. Em seguida o baldio, onde seria levantado o Conservatório Mineiro, a casa amarela do Maestro Flores […] Naquele ponto o céu era o mais longínquo do mundo e as estrelas palpitavam em alturas inconcebíveis. Eu andava de um lado para o outro na avenida como imantado por tal ou qual polo de atração. […] Nas noites escuras ou de chuva, tomava Cláudio Manuel, Chumbo, logo acima da esquina de Palmira dava com o Louco da Noite sempre parado debaixo dum poste de iluminação, pasmo, recebendo aquela luz voltaica e as águas do céu – sem ir, vir, esconder-se, voltar, falar. Imóvel, fora do tempo, estuporado, catatônico. Todos temiam-no na Serra. Mas ele era tímido e manso.
NAVA, Pedro. Beira-Mar. Memórias 4. Nova Fronteira, 1985. p. 132.
TRECHO 4
Noturno de Belo Horizonte
Dorme Belo Horizonte.
Seu corpo respira leve o aclive vagarento das ladeiras…
Não se escuta sequer o ruído das estrelas caminhando…
Mas os poros abertos da cidade
Aspiram com sensualidade com delícia
O ar da terra elevada.
Ar arejado batido nas pedras dos morros,
Varado através da água trançada das cachoeiras,
Ar que brota nas fontes com as águas
Por toda a parte de Minas Gerais.
ANDRADE, Mário de. Poesias completas.
Para responder a questão, leia os trechos 1, 2, 3, 4 e as considerações que se apresentam logo após o trecho 4.
I - Cada um dos trechos (1, 2, 3 e 4) apresenta uma leitura particular que o autor faz da cidade de Belo Horizonte. Em cada um deles, a partir de um ponto de vista, emerge uma cidade.
II - Quando lemos textos que leem a cidade, estamos partilhando de uma construção de sentido de um dado objeto, na qual está inscrito o modo como o autor desenha, mapeia a cidade, ou seja, apreende e representa tal objeto.
III - A descrição dos elementos físico-geográficos (a paisagem urbana) feita no universo do discurso literário pode ser talhada pela memória subjetiva, pela fabricação discursiva de um objeto, que difere daquela que se dá nos manuais de instrução da geografia ou de turismo.
A afirmativa está CORRETA em:
a) apenas I.
b) apenas I e II.
c) apenas II e III.
d) I, II e III.
Gabarito:
c) apenas II e III.
(PUC-SP-2001)
A QUESTÃO É COMEÇAR
Coçar e comer é só começar. Conversar e escrever também. Na fala, antes de iniciar, mesmo numa livre conversação, é necessário quebrar o gelo. Em nossa civilização apressada, o “bom dia”, o “boa tarde, como vai?” já não funcionam para engatar conversa. Qualquer assunto servindo, fala-se do tempo ou de futebol.
No escrever também poderia ser assim, e deveria haver para a escrita algo como conversa vadia, com que se divaga até encontrar assunto para um discurso encadeado. Mas, à diferença da conversa falada, nos ensinaram a escrever e na lamentável forma mecânica que supunha texto prévio, mensagem já elaborada. Escrevia-se o que antes se pensara. Agora entendo o contrário: escrever para pensar, uma outra forma de conversar. Assim fomos “alfabetizados”, em obediência a certos rituais.
Fomos induzidos a, desde o início, escrever bonito e certo. Era preciso ter um começo, um desenvolvimento e um fim predeterminados. Isso estragava, porque bitolava, o começo e todo o resto. Tentaremos agora (quem? eu e você, leitor) conversando entender como necessitamos nos reeducar para fazer do escrever um ato inaugural; não apenas transcrição do que tínhamos em mente, do que já foi pensado ou dito, mas inauguração do próprio pensar. “Pare aí”, me diz você. “O escrevente escreve antes, o leitor lê depois.” “Não!”, lhe respondo, “Não consigo escrever sem pensar em você por perto, espiando o que escrevo.
Não me deixe falando sozinho.” Pois é; escrever é isso aí: iniciar uma conversa com interlocutores invisíveis, imprevisíveis, virtuais apenas, sequer imaginados de carne e ossos, mas sempre ativamente presentes. Depois é espichar conversas e novos interlocutores surgem, entram na roda, puxam assuntos. Termina-se sabe Deus onde.
(MARQUES, M.O. Escrever é Preciso, Ijuí, Ed. UNIJUÍ, 1997, p. 13).
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Observe a seguinte afirmação feita pelo autor:
“Em nossa civilização apressada, o “bom dia”, o “boa tarde” já não funcionam para engatar conversa. Qualquer assunto servindo, fala-se do tempo ou de futebol.”
Ela faz referência à função da linguagem cuja meta é “quebrar o gelo”.
Indique a alternativa que explicita essa função.
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(Pucpr 2004)
"Aula de Português"
A linguagem na ponta da língua,
tão fácil de falar e de entender.
A linguagem na superfície estrelada das estrelas,
sabe lá o que ela quer dizer?
(ANDRADE, Carlos Drummond de. Boitempo. In: "Poesia e Prosa". Rio: Nova Aguilar,1988.)
Em relação às duas estrofes do poema "Aula de Português", de Carlos Drummond de Andrade, assinale a alternativa INCORRETA:
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(Puccamp 2016) Comenta-se corretamente sobre o que se tem no trecho.
A questão a seguir refere-se ao trecho do capítulo 2 da obra Ginástica doce e yoga para crianças: método La Douce.
CAPÍTULO 2 (O CORPO)
Conhecer bem o corpo para fazê-lo trabalhar melhor
Cinco extremidades: a cabeça, as mãos, os pés
Para comunicar-se com tudo que a cerca, a criança usa a cabeça, as duas mãos e os dois pés. A cabeça permite-lhe ter acesso a todas as informações disponíveis. Sede do cérebro, ela fornece os recursos necessários para bem compreender seu ambiente. É igualmente através desta parte do corpo que penetram duas fontes de energia: o ar e o alimento. A cabeça se articula através do pescoço. Corredor estreito entre o cérebro e a parte inferior do corpo, o pescoço deve ser flexível para facilitar a qualidade das trocas. As mãos e os pés são verdadeiras antenas. Sua riqueza em terminações nervosas e vasos sanguíneos, assim como a possibilidade das inúmeras articulações, fazem deles instrumentos de extraordinária precisão.
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(Puccamp 2016)
Editorial
Na rotina de mãe de quatro filhos, a escritora israelense Ayelet Waldman começou a detectar em si mesma e em outras mães que conhecia uma ansiedade persistente, disparada pela frustração de não corresponder às próprias expectativas em relação à maternidade. Para piorar seu tormento, 1aonde quer que fosse, encontrava mulheres sempre prontas a apontar o dedo para seus defeitos, numa espécie de polícia materna, onipresente e onisciente. Em uma conversa deliciosa com a Revista em Dia, Ayelet discorre sobre as agruras das mães ruins, categoria na qual hoje se encaixa, e com orgulho. 2E ajuda a dissipar, com humor, o minhocário que não raro habita a cabeça das mães. Minhocário que, aliás, se não for bem administrado, pode levar a problemas muito mais sérios. 3É o que você verá na reportagem da página 14, que traz o foco para a depressão durante a gravidez. Poucos sabem, mas a doença pode ser deflagrada nessa fase e é bom que tanto as gestantes como outras pessoas ao redor fiquem atentas para que as mulheres nessa situação possam receber o apoio necessário. A revista também traz temas para quem a maternidade já é assunto menos relevante 4nesse momento da vida. Se você é daquelas que entraram ou consideram entrar na onda da corrida, terá boas dicas na página 18. 5Caso já esteja reduzindo o ritmo, quem sabe encontre inspiração para espantar a monotonia na crônica da página 8. Esperamos, com um grãozinho aqui, outro ali, poder contribuir um pouco para as várias facetas que compõem uma mulher saudável e de bem consigo mesma.
Comenta-se com correção:
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