Questão 33953

(IME - 2018/2019 - 2ª FASE ) 

Texto 1

BECOS DE GOIÁS

1 Beco da minha terra...
  Amo tua paisagem triste, ausente e suja.
  Teu ar sombrio. Tua velha umidade andrajosa.
  Teu lodo negro, esverdeado, escorregadio.
5 E a réstia de sol que ao meio-dia desce, fugidia,
  e semeia polmes dourados no teu lixo pobre,
  calçando de ouro a sandália velha,
  jogada no teu monturo.
   
  Amo a prantina silenciosa do teu fio de água,
10 descendo de quintais escusos
  sem pressa,
  e se sumindo depressa na brecha de um velho cano.
  Amo a avenca delicada que renasce
  na frincha de teus muros empenados,
15 e a plantinha desvalida, de caule mole
  que se defende, viceja e floresce
  no agasalho de tua sombra úmida e calada.
   
  Amo esses burros-de-lenha
  que passam pelos becos antigos. Burrinhos dos morros,
20 secos, lanzudos, malzelados, cansados, pisados.
  Arrochados na sua carga, sabidos, procurando a sombra,
  no range-range das cangalhas.
   
  E aquele menino, lenheiro ele, salvo seja.
  Sem infância, sem idade.
25 Franzino, maltrapilho,
  pequeno para ser homem,
  forte para ser criança.
  Ser indefeso, indefinido, que só se vê na minha cidade.
   
  Amo e canto com ternura
30 todo o errado da minha terra.
  Becos da minha terra,
  discriminados e humildes,
  lembrando passadas eras...
   
  Beco do Cisco.
35 Beco do Cotovelo.
  Beco do Antônio Gomes.
  Beco das Taquaras.
  Beco do Seminário.
  Bequinho da Escola.
40 Beco do Ouro Fino.
  Beco da Cachoeira Grande.
  Beco da Calabrote.
  Beco do Mingu.
  Beco da Vila Rica...
   
45 Conto a estória dos becos,
  dos becos da minha terra,
  suspeitos... mal afamados
  onde família de conceito não passava.
  “Lugar de gentinha” - diziam, virando a cara.
   
50 De gente do pote d’água.
  De gente de pé no chão.
  Becos de mulher perdida.
  Becos de mulheres da vida.
  Renegadas, confinadas
55 na sombra triste do beco.
  Quarto de porta e janela.
  Prostituta anemiada,
  solitária, hética, engalicada,
  tossindo, escarrando sangue
60 na umidade suja do beco.
   
  Becos mal assombrados.
  Becos de assombração...
  Altas horas, mortas horas...
  Capitão-mor - alma penada,
65 terror dos soldados, castigado nas armas.
  Capitão-mor, alma penada,
  num cavalo ferrado,
  chispando fogo,
  descendo e subindo o beco,
70 comandando o quadrado - feixe de varas...
  Arrastando espada, tinindo esporas...
  Mulher-dama. Mulheres da vida,
  perdidas,
  começavam em boas casas, depois,
75 baixavam pra o beco.
  Queriam alegria. Faziam bailaricos.
   Baile Sifilítico - era ele assim chamado.
  O delegado-chefe de Polícia - brabeza -
  dava em cima...
80 Mandava sem dó, na peia.
  No dia seguinte, coitadas,
  cabeça raspada a navalha,
  obrigadas a capinar o Largo do Chafariz,
  na frente da Cadeia.
   
85 Becos da minha terra...
  Becos de assombração.
  Românticos, pecaminosos...
  Têm poesia e têm drama.
  O drama da mulher da vida, antiga,
90 humilhada, malsinada.
  Meretriz venérea,
  desprezada, mesentérica, exangue.
  Cabeça raspada a navalha,
  castigada a palmatória,
95 capinando o largo,
  chorando. Golfando sangue.
   
  (ÚLTIMO ATO)
   
  Um irmão vicentino comparece.
  Traz uma entrada grátis do São Pedro de Alcântara.
100 Uma passagem de terceira no grande coletivo de São Vicente.
  Uma estação permanente de repouso - no aprazível São Miguel.
   
  Cai o pano.

CORALINA, Cora. Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais. 21a ed. - São Paulo: Global Editora, 2006.

“Amo e canto com ternura / todo o errado da minha terra” (texto 1, versos 29 e 30).

A substantivação do adjetivo “errado”, antecedido pelo determinante “o”, que aparece no trecho acima destacado do poema de Cora Coralina

A

fala do desdém relativo à maneira como vivem os habitantes dos becos.

B

mostra que a voz poética é avessa a tudo o que acontece nos becos.

C

salienta uma proximidade e cumplicidade entre quem ama e quem recebe o amor.

D

revela apatia em relação aos becos de Goiás e a seus frequentadores.

E

trata unicamente da exclusão social dos moradores dos becos.

Gabarito:

salienta uma proximidade e cumplicidade entre quem ama e quem recebe o amor.



Resolução:

[C]

A substantivação do adjetivo "errado" faz dele o objeto direto do verbo "amar". Com essa construção, a poeta evidencia uma materialização do "errado" (as coisas feias, mal amadas, marginalizadas), capaz de aproximar o eu lírico [quem ama] desse "errado" [que recebe o amor]. Diferente de "Amo e canto todas as coisas erradas" (em que "as coisas" marcaria certo distanciamento e estranhamento), o verso de Coralina ("amo e canto todo o errado") realiza uma identificação entre o sujeito do verbo (eu) e seu objeto (o errado), sem mediação. 

Sobre as demais afirmativas: 

a) a postura do eu lírico não é de desdém, muito pelo contrário. Os verbos "amar" e "cantar", seguidos do advérbio "com ternura" mostram uma relação de orgulho e identificação entre o eu lírico e "o errado" de sua terra; 

b) a voz poética em "Becos de Goiás" demonstra afeto, empatia, compaixão e proximidade diante do que acontece nos espaços da cidade. A substantivação dessas coisas, "o errado", as materializa e aproxima do sujeito enunciador, mostrando seu carinho, e não sua aversão; 

d) a substantivação não revela apatia, visto que corporifica "o errado" e o traz, como objeto, mais próximo à ação de amar e, por extensão, ao sujeito que ama. Combinada a isso, a "ternura" presente no verso impede a inferência de uma possível apatia; 

e) A ênfase no "errado" não faz com que o foco único seja a exclusão dos moradores. Essa palavra, substantivada, acaba se tornando uma entidade capaz de resumir diversas coisas, como se vê pelo repertório que vem em seguida: espaços, pessoas, situações e outros elementos dos "becos" que são tratados no canto do eu lírico. 



Questão 992

(IME 2007) 

O gráfico acima apresenta a velocidade de um objeto em função do tempo. A aceleração média do objeto no intervalo de tempo de 0 a 4t é:   

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Questão 993

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