Questão 33958

(IME - 2018/2019 - 2ª FASE )

Texto 1

BECOS DE GOIÁS

1 Beco da minha terra...
  Amo tua paisagem triste, ausente e suja.
  Teu ar sombrio. Tua velha umidade andrajosa.
  Teu lodo negro, esverdeado, escorregadio.
5 E a réstia de sol que ao meio-dia desce, fugidia,
  e semeia polmes dourados no teu lixo pobre,
  calçando de ouro a sandália velha,
  jogada no teu monturo.
   
  Amo a prantina silenciosa do teu fio de água,
10 descendo de quintais escusos
  sem pressa,
  e se sumindo depressa na brecha de um velho cano.
  Amo a avenca delicada que renasce
  na frincha de teus muros empenados,
15 e a plantinha desvalida, de caule mole
  que se defende, viceja e floresce
  no agasalho de tua sombra úmida e calada.
   
  Amo esses burros-de-lenha
  que passam pelos becos antigos. Burrinhos dos morros,
20 secos, lanzudos, malzelados, cansados, pisados.
  Arrochados na sua carga, sabidos, procurando a sombra,
  no range-range das cangalhas.
   
  E aquele menino, lenheiro ele, salvo seja.
  Sem infância, sem idade.
25 Franzino, maltrapilho,
  pequeno para ser homem,
  forte para ser criança.
  Ser indefeso, indefinido, que só se vê na minha cidade.
   
  Amo e canto com ternura
30 todo o errado da minha terra.
  Becos da minha terra,
  discriminados e humildes,
  lembrando passadas eras...
   
  Beco do Cisco.
35 Beco do Cotovelo.
  Beco do Antônio Gomes.
  Beco das Taquaras.
  Beco do Seminário.
  Bequinho da Escola.
40 Beco do Ouro Fino.
  Beco da Cachoeira Grande.
  Beco da Calabrote.
  Beco do Mingu.
  Beco da Vila Rica...
   
45 Conto a estória dos becos,
  dos becos da minha terra,
  suspeitos... mal afamados
  onde família de conceito não passava.
  “Lugar de gentinha” - diziam, virando a cara.
   
50 De gente do pote d’água.
  De gente de pé no chão.
  Becos de mulher perdida.
  Becos de mulheres da vida.
  Renegadas, confinadas
55 na sombra triste do beco.
  Quarto de porta e janela.
  Prostituta anemiada,
  solitária, hética, engalicada,
  tossindo, escarrando sangue
60 na umidade suja do beco.
   
  Becos mal assombrados.
  Becos de assombração...
  Altas horas, mortas horas...
  Capitão-mor - alma penada,
65 terror dos soldados, castigado nas armas.
  Capitão-mor, alma penada,
  num cavalo ferrado,
  chispando fogo,
  descendo e subindo o beco,
70 comandando o quadrado - feixe de varas...
  Arrastando espada, tinindo esporas...
  Mulher-dama. Mulheres da vida,
  perdidas,
  começavam em boas casas, depois,
75 baixavam pra o beco.
  Queriam alegria. Faziam bailaricos.
   Baile Sifilítico - era ele assim chamado.
  O delegado-chefe de Polícia - brabeza -
  dava em cima...
80 Mandava sem dó, na peia.
  No dia seguinte, coitadas,
  cabeça raspada a navalha,
  obrigadas a capinar o Largo do Chafariz,
  na frente da Cadeia.
   
85 Becos da minha terra...
  Becos de assombração.
  Românticos, pecaminosos...
  Têm poesia e têm drama.
  O drama da mulher da vida, antiga,
90 humilhada, malsinada.
  Meretriz venérea,
  desprezada, mesentérica, exangue.
  Cabeça raspada a navalha,
  castigada a palmatória,
95 capinando o largo,
  chorando. Golfando sangue.
   
  (ÚLTIMO ATO)
   
  Um irmão vicentino comparece.
  Traz uma entrada grátis do São Pedro de Alcântara.
100 Uma passagem de terceira no grande coletivo de São Vicente.
  Uma estação permanente de repouso - no aprazível São Miguel.
   
  Cai o pano.

CORALINA, Cora. Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais. 21a ed. - São Paulo: Global Editora, 2006.

O texto 1 se inicia em um processo descritivo e passa para o descritivo-narrativo. Isso se confirma pelo(a)

A

contraste entre o uso abundante de adjetivos concomitante ao parco uso de formas verbais nas primeiras estrofes em relação à recorrência de formas verbais indicativas de ação conjugadas, predominantemente, no pretérito imperfeito do modo indicativo nas estrofes finais.

B

uso de verbos conjugados na primeira pessoa do singular do modo indicativo nas primeiras estrofes em contraste com os verbos conjugados em terceira pessoa do pretérito imperfeito do indicativo nas estrofes finais.

C

frequência com que aparecem, no início do poema, palavras cujos significados estão associados à tristeza e ao abandono dos becos em contraste com o final do poema em que comparecem forças preocupadas em garantir ordem na vida pública.

D

fato de que a escritora se conforma ao processo mais tradicional na construção dos poemas.

E

necessidade de dar ao poema um tom realista, afastando-o do romantismo tradicionalmente associado às formas poéticas como um todo.

Gabarito:

contraste entre o uso abundante de adjetivos concomitante ao parco uso de formas verbais nas primeiras estrofes em relação à recorrência de formas verbais indicativas de ação conjugadas, predominantemente, no pretérito imperfeito do modo indicativo nas estrofes finais.



Resolução:

[A]

É característica do tipo descritivo o uso abundante de adjetivos. A descrição por adjetivos é verificável e dominante em grande parte do poema, desde o início: 

“Amo tua paisagem triste, ausente e suja.
Teu ar sombrio. Tua velha umidade andrajosa.
Teu lodo negro, esverdeado, escorregadio
E a réstia de sol que ao meio-dia desce, fugidia,
e semeia polmes dourados no teu lixo pobre,
calçando de ouro a sandália velha,
jogada no teu monturo. [...]"

Ao final do poema, no entanto, o discurso descritivo se mistura à narração, visto que alguns fatos, ações e acontecimentos ganham destaque. Isso se dá pela ocorrência de verbos de ação, que surgem tanto no pretérito imperfeito como no presente "histórico": 

"Mulher-dama. Mulheres da vida,
perdidas,
começavam em boas casas, depois,
baixavam pra o beco.
Queriam alegria. Faziam bailaricos.
 Baile Sifilítico - era ele assim chamado.
O delegado-chefe de Polícia - brabeza -
dava em cima...
Mandava sem dó, na peia.
No dia seguinte, coitadas,
cabeça raspada a navalha, [...]

Um irmão vicentino comparece.
Traz uma entrada grátis do São Pedro de Alcântara. [...]". 

Sobre as demais afirmativas: 

b) ainda que a identificação das formas verbais seja compatível com o poema, ela não confirma o contraste entre as tipologias descritiva e narrativa presentes no texto; 

c) o contraste entre tristeza x ordem pública, além de infundado (visto que a ordem pública traz, também, tristeza), não comprova ou evidencia a alternância entre os discursos mais descritivo e mais narrativo; 

d) Cora Coralina não se atém a regras e princípios tradicionais de composição, e não há nada nessas tradições que leve a pensar numa estrutura que oscile entre descrição e narração, assim dispostas; 

e) o romantismo não é associado às formas poéticas como um todo, e a tipologia textual predominante nas partes do poema não possui relação causal ou direta com a expressão realista. É possível gerar esse sentido de "realismo" tanto com a narração como com a descrição. 



Questão 992

(IME 2007) 

O gráfico acima apresenta a velocidade de um objeto em função do tempo. A aceleração média do objeto no intervalo de tempo de 0 a 4t é:   

Ver questão

Questão 993

(IME 2007) Um cubo de material homogêneo, de lado L = 0,4 m e massa M = 40 kg, está preso  à extremidade superior de uma mola, cuja outra extremidade está fixada no fundo de um recipiente vazio. O peso do cubo provoca na mola uma deformação de 20 cm. Coloca-se água no recipiente até que o cubo fique com a metade de seu volume submerso. Se a massa específica da água é , a deformação da mola passa a ser: 

Ver questão

Questão 994

(IME 2007)  Uma nave em órbita circular em torno da Terra usa seus motores para assumir uma nova órbita circular a uma distância menor da superfície do planeta. Considerando desprezível a variação da massa do foguete, na nova órbita: 

Ver questão

Questão 995

(IME 2007) Um gás ideal sofre uma expansão isotérmica, seguida de uma compressão adiabática. A variação total da energia interna do gás poderá ser nula se, dentre as opções abaixo, a transformação seguinte for uma:

Ver questão