Questão 57561

(Cftrj 2020) 

Racismo contra imigrantes no Brasil é constante, diz pesquisador

Na tese Dois Séculos de Imigração no Brasil: A Construção da Identidade e do Papel dos Estrangeiros pela Imprensa entre 1808 e 2015, [o pesquisador Gustavo] Barreto analisou a cobertura do tema em jornais como O Globo, O Estado de S. Paulo, Folha da Manhã (hoje Folha de S. Paulo), Correio da Manhã, O País e Gazeta do Rio de Janeiro ao longo de 207 anos.

Em entrevista à BBC Brasil, ele explica como os termos são usados de forma diferente na imprensa. "O refugiado é sempre negativo, um problema grave a ser discutido. O imigrante é uma questão a ser avaliada, pode ser algo positivo ou negativo, mas em geral a visão é de algo problemático. Já o estrangeiro é sempre positivo, inclusive melhor do que o brasileiro. É alguém com quem podemos aprender", diz.

Veja os principais trechos da entrevista:

Quanto ao racismo, é possível identificar avanços? Como tem sido a cobertura da chegada de imigrantes haitianos e bolivianos ao Brasil, mais recentemente?

Barreto – O racismo era algo natural e aceitável no século 19, incluindo o destaque às ideias de supremacia de raças, entre 1870 até o governo Vargas. A partir da Segunda Guerra, os grupos começam a ser valorizados. Judeus, alemães e italianos no Brasil começam a recontar sua história, assim como os japoneses, depois de um momento muito difícil. Após as cartas de direitos humanos, os valores eugenistas1 já não são mais declarados, o que é um avanço.

Mais recentemente, o país passou a receber um número considerável de bolivianos e haitianos. Mas também chegam portugueses e espanhóis. A imprensa, no entanto, costuma destacar muito os problemas que os haitianos trazem, e rapidamente começa a ser construída uma visão de que eles são um problema. Enquanto isso, os imigrantes europeus recentes são valorizados por sua cultura e contribuição ao Brasil.

Contribuições culturais ou produtivas dos haitianos e bolivianos, que têm uma riqueza cultural enorme, dificilmente viram notícia. O racismo atual se dá pelo não dito, pelo que a imprensa omite. Quando aparecem na mídia estão atrelados a problemas, crises, marginalizações, ou ligados à ideia de uma invasão. (...)

Suas observações não contrastam com a ideia tão difundida do Brasil como um país hospitaleiro, e do brasileiro como um povo acolhedor, famoso no mundo todo pela simpatia e boa recepção aos estrangeiros?

Barreto – Na verdade entre os pesquisadores do assunto há a noção do "mito da hospitalidade". Há uma diferença entre a maneira como nos vendemos para o mundo e a verdadeira hospitalidade a qualquer estrangeiro ou a democracia racial.

O estudo de como a imigração é retratada no país entre 1808 e 2015 mostra que a hospitalidade é seletiva, mas que essa noção sempre foi difundida, em benefício do Brasil. Esta é uma das minhas principais conclusões na tese, a de que a nossa famosa hospitalidade é um mito. (...)

Você citou um editorial do jornal Folha da Manhã, de 1926, intitulado "Fechem-se as fronteiras". Esta seria um pouco a noção de que o Brasil enxergou durante muito tempo a imigração de forma unilateral e seletiva? Ainda vemos este discurso?

2Barreto – Sim, o tema do editorial de 1926 é justamente a noção de que o país já teria recebido todos os imigrantes necessários. Já chegaram todos que nós queremos, após a vinda em massa de alemães e italianos, foi cumprida a função da imigração no Brasil. Já ocupamos e populamos o país, e agora as fronteiras devem ser fechadas e quem entrar deverá ser muito bem selecionado.

Hoje em dia a posição continua, mas travestida por outro argumento. A imprensa trabalha com o mito de que somos um país pobre, em desenvolvimento, e não temos condições de receber mais ninguém. Vamos receber somente os melhores e mais úteis. São evidências no discurso da imprensa e na visão da sociedade brasileira que contrastam diretamente com a ideia do "Brasil hospitaleiro, onde todos são bem-vindos".

No contexto atual, de crise económica e política, há que se observar atentamente a maneira como o imigrante será retratado na imprensa, por ele ser um excelente bode expiatório para os problemas. Não tem grande chance de defesa, não está integrado ao país, é o outro, o diferente, que traz dificuldades.

Desemprego, inflação e crise tendem a tornar a visão dos imigrantes ainda mais negativa.

(PUFF, Jefferson. Racismo contra imigrantes no Brasil é constante. 26 ago. 2015. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/08/150819_racismo_imigrantes_jp_rm. Acesso em: 8 set. 2019)

Vocabulário

1 Eugenista: adepto da eugenia, teoria desenvolvida no século XIX que defendia a superioridade e o melhoramento das raças, estimulando o embranquecimento da população

Leia o fragmento abaixo, destacado do texto:

"Barreto – Sim, o tema do editorial de 1926 é justamente a noção de que o país já teria recebido todos os imigrantes necessários. Já chegaram todos que nós queremos, após a vinda em massa de alemães e italianos, foi cumprida a função da imigração no Brasil. Já ocupamos e populamos o país, e agora as fronteiras devem ser fechadas e quem entrar deverá ser muito bem selecionado." (ref. 2)

O efeito de sentido provocado pelo uso da primeira pessoa do plural é:

A

simular o ponto de vista dos governantes da década de 1920.

B

inserir o entrevistado no contexto brasileiro em questão.

C

induzir o leitor a concordar com o argumento do editorial. 

D

convocar o leitor para que se posicione como o entrevistado.

Gabarito:

simular o ponto de vista dos governantes da década de 1920.



Resolução:

[A]

Essa é uma questão de interpretação de texto onde você deve ser capaz de identificar e interpretar as intenções de um interlocutor ao utilizar certo elemento estilístico (a primeira pessoa). No caso, na fala de Barreto temos a resposta à uma questão sobre um editorial publicado em 1926, onde ele começa respondendo à questão, mas logo em seguida há uma mudança em sua fala, uma troca de foco narrativo, sendo que ele passa a falar na primeira pessoa do plural, assumindo a posição da Folha de 1926, relatando a lógica por trás do editorial, ou seja, simular o ponto de vista dos governantes, tal como coloca a afirmativa A, que figura como a correta.



Questão 40266

(CEFET-RJ - 2014)

Turismo na favela: E os moradores?

 

     Água morro abaixo, fogo morro acima e invasão de turistas em favelas pacificadas são difíceis de conter. Algo precisa ser feito para que a positividade do momento não transforme esses lugares em comunidades “só pra inglês ver”. As favelas pacificadas tornaram-se alvo de uma volúpia consumidora poucas vezes vista no Rio de Janeiro. O momento em que se instalaram as Unidades de Polícia Pacificadora em algumas favelas foi como se tivesse sido descoberto um novo sarcófago de Tutankamon, o faraó egípcio: uma legião de turistas, pesquisadores, empresários, comerciantes “descobriram” as favelas.

     O Santa Marta, primeira favela a ter uma UPP ao longo dos seus quase 80 anos, sempre recebeu, na maioria das vezes de forma discreta, visitantes estrangeiros. E, em alguns casos, ilustres: Rainha Elizabeth, Senador Kennedy, Gilberto Gil. Até mesmo Michael Jackson, quando gravou seu clipe na favela, não permitiu a presença da mídia. A partir de 2008, iniciou-se a era das celebridades e a exposição da favela para o mundo.

      Algumas perguntas, porém, precisam ser feitas e respondidas no momento em que o poder público pensa em investir nesse filão: o que é uma favela preparada para receber turistas? Que 1“maquiagem” precisa ser feita para que o turista se sinta bem? Que produtos os turistas querem encontrar ali? O comércio local deve adaptar-se aos turistas ou servir aos moradores? Se o Morro não é uma propriedade particular, se não tem um dono, todo e cada morador tem o direito de opinar sobre o que está se passando com o seu lugar de moradia.

     Essas e outras questões devem pautar o debate entre moradores e gestores públicos sobre o turismo nas favelas pacificadas. Se os moradores não se organizarem e se não assumirem o protagonismo das ações de turismo e de entretenimento no Santa Marta, vamos assistir aos nativos — os de dentro — servindo de testa de ferro para empreendimentos e iniciativas dos de fora, às custas de uma identidade local que aos poucos vai perdendo suas características.

     Tomar os princípios do turismo comunitário — integridade das identidades locais, protagonismo e autonomia dos moradores — talvez ajude-nos a encontrar estratégias para receber os de fora sem sucumbir às regras violentas de um turismo mercadológico.


Itamar Silva é Presidente do Grupo Eco — Santa Marta e diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase). Adaptado de: Jornal O Dia, 31/01/2013.  

 

“Água morro abaixo, fogo morro acima e invasão de turistas em favelas pacificadas são difíceis de conter. Algo precisa ser feito para que a positividade do momento não transforme esses lugares em comunidades ‘só pra inglês ver’.”


Embora os dois períodos acima não estejam ligados por meio de um conectivo, é possível identificar uma relação de sentido entre eles, atribuindo-se coerência ao fragmento. Essa relação de sentido poderia ser explicitada pelo uso do seguinte elemento de coesão: 

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Questão 57257

(G1 - cftrj 2019)

Por que temos poucos memoriais de abolição da escravidão?

Lilia Schwarcz

Lembrar é uma forma de não deixar esquecer. O Brasil foi destino de mais de 40% de africanos e africanas por aqui escravizados, e precisa cuidar, de maneira crítica, da sua memória.

Bem no meio da pacata cidade de Nantes, na França, uma calçada reluz estranhamente ao Sol. São centenas de pequenas placas retangulares, feitas de um vidro translúcido e de cor azul celeste, espalhadas por uma via onde passam mães levando seus carrinhos de bebê, rapazes andando de bicicleta, moços e moças fazendo 1jogging, senhores e senhoras apressados a caminho do trabalho.

Somente apurando bem os olhos é possível notar que há sempre um título gravado por debaixo desses delicados sinais brilhantes, dispostos simetricamente ao chão. Le Saint Jean Baptiste, Le Juste, L’Union, La Valeur, La Felicité, Le Bien Aimée e Brásil2 são alguns dos muitos nomes de navios negreiros que, desde o século 16 e até o final do 19, partiram de porto de Nantes ou lá aportaram. Os apelidos dados aos barcos parecem denotar uma certa culpa, tamanha a desproporção entre eles e a tarefa que buscavam descrever.

Essas eram embarcações que transportavam de tudo um pouco: tecidos, produtos agrícolas, azulejos, minérios, especiarias, mas, acima de tudo, pessoas. Eles eram tumbeiros, navios negreiros que faziam o comércio de almas no contexto moderno, quando o mundo ocidental reinventou uma nova escravidão; uma escravidão mercantil. Os navios vinham e voltavam cheios de “mercadorias”. Não havia espaço ocioso ou lugar nas embarcações que deixassem de auferir lucro: de uma ponta saíam produtos agrícolas, de outra, metais preciosos, de outra, ainda, africanos e africanas transformados em valiosos objetos de comércio.

Foram recenseadas mais de 27.233 expedições marítimas que partiram de portos europeus durante esses quatro longos séculos em que perdurou o sistema escravocrata. No total, mais de 12 milhões e meio de mulheres, homens e crianças foram arrancadas à força da África e deportados para as Américas e para o caribe. Mais de um milhão e meio dessas pessoas morreram durante a travessia. Só de Nantes saíram em torno de 1.800 expedições negreiras, tendo elas apresado mais 550 mil africanos e africanas.

Os números são fortes, definitivos, e explicam o motivo da criação, em Nantes, de um impressionante “Memorial da abolição da escravidão”, inaugurado no dia 25 de março de 2012. A edificação é discreta e ao mesmo tempo tocante. Na verdade, é preciso conhecer o lugar, ou ser previamente informado, para saber que na cidade existe um memorial e, ademais, um museu basicamente dedicado ao tema.

Andar por aquela estranha calçada, agachar para ler os nomes dos navios, observar as datas em que cada uma destas embarcações circulou, olhar para o mesmo mar, acaba sendo um exercício muito doloroso. Difícil sair de lá da mesma maneira como se chegou. É impossível deixar de anotar a inacreditável quantidade de naus dedicadas a esse comércio de almas, que gerou a maior 3diáspora desde a época romana. Mais difícil ainda é tentar visualizar a maneira como se “armazenavam” os bens importados, sem discriminação de pessoas ou produtos. Esse talvez seja o motivo de o memorial continuar numa espécie de subsolo, onde se encontra uma cronologia da escravidão e um a série de frases retiradas de textos de ativistas, literatos e filósofos que lutaram pela abolição desse sistema. [...]

Memória e história nem sempre andam juntas. Afinal, muitas vezes, quando é difícil lembrar, o melhor caminho parece ser ignorar. Fico me perguntando, no entanto, se esquecer ou descuidar não são maneiras de dar espaço à incredulidade e de construir o pouco caso diante de uma realidade tão brutal e tão presente em nossa história nacional contemporânea.

Em maio de 2018 faremos 130 anos de abolição da escravidão mercantil no Brasil. Que a data vire cicatriz. Como escreveu Caio Fernando Abreu: “Menos pela cicatriz deixada, uma ferida antiga mede-se mais exatamente pela dor que provocou, e para sempre perdeu-se no momento em que cessou de doer, embora lateje louca nos dias de chuva”.

(Adaptado de Nexo Jornal Ltda. Coluna. 9 de abril de 2018. Disponível em: https://www.nexojornal.com.br/colunistas/2018/Por-que-temospoucos-memoriais-de-aboli%C3%A7%C3%A3o-da-escravid%C3%A3o. Acesso em 17 de setembro de 2018.)

Notas:

1Corrida

2São João Batista, O Justo, A União, O Valor, A Felicidade, O Bem-Amado e Brasil.

3Dispersão de um povo em consequência de preconceito ou perseguição política, religiosa ou étnica.

Na construção da argumentação do texto, a referência à cidade de Nantes, na França, cumpre principalmente o papel de:

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Questão 59743

(CEFET) Atualemente a água mineral gaseificada (I) tem sido uma alternativa aos refrigerantes e à água mineral, já que muitas pessoas reclamam da ausência de sabor. Esse tipo de água é livre de açucar, de calorias e também hidrata (II). Porém, muitas pessoas ainda têm dúvida sobre seus efeitos negativos à saúde, como a corrosão do esmalte dos dentes, por exemplo.

Em relação à água gaseificada e sua estrutura, podemos dizer que se trata de uma:

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