Questão 61610

(FCMMG - 2016) 

A MENTE QUE TUDO PODE

O médico me garante que a maioria de nossos males tem origem psicossomática. Talvez a totalidade, ele acrescenta. Do alto de sua longa experiência, garante que pessoas felizes não ficam de cama. Para comprovar a tese, relaciona tipos de personalidade com as doenças: os muito exigentes ficam hipertensos, os nervosos contraem dermatoses, os obsessivos desenvolvem câncer, os estressados sofrem acidentes cardiovasculares. A mente tudo pode. Mente?

O médico não está sozinho. Muita gente acredita que a mecânica newtoniana – a ação e a reação – se aplica à saúde humana com a mesma precisão que às maçãs em queda livre. Li um artigo sobre os males que acometeram pessoas famosas a partir da análise de suas cabeças, do tipo fulano morreu assim porque era assado (assados morreram muitos, porque ousaram pensar). Até parece que nossos miolos são imutáveis e possuem uma característica única, sem direito à tristeza, estresse, euforia, obsessão ou felicidade de vez em quando.

As listas de causa e efeito fazem as previsões de doenças a posteriori. Nunca antes dos sintomas. Que mal contrairá o desempregado que teme voltar para casa à noite e comunicar à família que nem biscate conseguiu? Como será hospitalizado o executivo que adora desafio e viciou em estresse? Posto de outra forma, por que uma senhora sem problemas familiares e financeiros, simpática, segura da vida eterna, contraiu um câncer que a matou com dores terríveis? Por que alguns bebês vêm ao mundo com leucemia? Por que indivíduos assumidamente infelizes chegam aos noventa anos infelizmente (para eles) bem de saúde? A satisfação, o amor e o sucesso vacinam contra o vibrião do cólera? Orgasmos múltiplos evitam a AIDS?

Enquanto o psicotudo se alastra, outros médicos destrinçam o genoma e descobrem relações cada vez mais convincentes entre a herança genética e o futuro da pessoa. Ou desvendam as reações químicas que os parasitas usam para penetrar nas células. Ou fazem cirurgias nos fetos.

A mente humana é poderosa, porém não pode tudo. Como disse Montaigne há séculos, ela cria milhares de deuses, mas não faz um rato. Com todo o arsenal de hoje, consegue mudar os roedores a partir do código genético existente. Criar mesmo, do nada, neca. Nem inteligência artificial. O mundo é bem maior do que a nossa imaginação.

Olho para o doutor com desconfiança, ele insiste que as gripes surgem através da queda imunológica devida ao estresse dos dias atuais. Pergunto-lhe por que os vírus não padecem do mesmo mal – ou por que derrotam as mentes psicologicamente equilibradas, bem tranquilas.

E mudo de médico.

GIFFONI, Luiz. http://blogdoluisgiffoni.blogspot.com.br/2015/07/
a-mente-que-tudo-pode.html?spref=fb. Acessado em: 22/07/2015.)

 

Na frase do texto “O médico não está sozinho.”, o uso do artigo definido “o” pode se justificar porque

A

vulgariza esse simples especialista.

B

especifica uma categoria em ascensão.

C

determina um profissional em particular.

D

generaliza essa classe profissional.

Gabarito:

generaliza essa classe profissional.



Resolução:

a) Alternativa incorreta. O fato de termos o artigo definido o antes do substantivo médico não o vulgariza (ou seja, o torna mais popular/acessível).

b) Alternativa incorreta​​​​​​​. A presença do artigo não se justifica por médico ser uma categoria em ascensão, já que o artigo não carrega nenhuma informação desse tipo.

c) Alternativa incorreta​​​​​​​. Apesar de, geralmente, os artigos definidos justamente definirem, falarem sobre algo ou alguém em específico, isso pode não ocorrer a depender do contexto, como é o caso de o médico não está sozinho. No primeiro parágrafo, descreve-se um pensamento corrente da classe médica e, no segundo, podemos ler que o médico não está sozinho, como em o professor não possui um salário digno, em que não estamos falando de um professor, mas sim de todos eles.

d) Alternativa correta​​​​​​​. Em contraponto ao que foi apresentado na alternativa C, o papel do artigo definido em o médico não está sozinho é generalizar o nome, abarcando toda a classe médica dentro dele.