(UNESP - 2011/2 - 2ª FASE)
REDAÇÃO
Leia os trechos dos textos que se referem ao futuro do livro.
TEXTO I
A possibilidade do fim do livro é traumática porque o livro não pode jamais ser visto apenas como material inerte ou simples objeto de consumo. É antes um objeto simbólico e uma instituição aos quais a cultura pós-Gutemberg confiou a tarefa de armazenar e fazer circular praticamente todo o conhecimento considerado relevante. Enquanto instituição, o livro representa uma forma de socialização que compreende todo um circuito de produção e consumo: autores, editores, leitores, críticos, comunidades interpretativas institucionalizadas. Como qualquer forma de socialização, a instituição do livro cria um espaço público, estabelece hierarquias e constitui identidades nos grupos e nos indivíduos que dela participam.
(Sérgio Luiz Prado Bellei, O fim do livro e o livro sem fim. Universidade Federal de Santa Catarina: http://lfilipe.tripod.com.bellei.html)
TEXTO II
Com relação ao desaparecimento do livro, os dois [Umberto Eco e Jean-Claude Carrière] observam com razão que as tecnologias digitais ficam obsoletas muito mais rapidamente que o livro impresso. Carrière vai buscar em sua biblioteca um pequeno incunábulo em latim, impresso em Paris em 1498; com exceção de umas poucas palavras obscuras, é perfeitamente legível como linguagem e como tecnologia, cinco séculos depois. E ele cita o caso de um cineasta belga, seu amigo, que tem no porão de casa 18 computadores diferentes, para poder consultar trabalhos antigos, criados em programas de PC que não são mais usados hoje.
Os dois comentam que a possibilidade atual de armazenar quantidades imensas de dados não significa que tudo isto continuará armazenado (e acessível) indefinidamente, e observam que mesmo uma biblioteca gigantesca não passa de uma mera seleção, um filtro de escolha, de prioridades, aplicado a uma cultura. ‘O que devemos preservar?’ – eis a questão, porque é impossível preservar tudo, tanto quanto é impossível consultar tudo quanto foi preservado (e que é necessariamente uma pequena parte desse todo).
(Braulio Tavares. Não contem com o fim do livro: http://jornaldaparaiba.globo.com/)
TEXTO III
Ou seja, apesar de sua imagem idealizada – às vezes, sacralizada – de fonte de lazer, informação, conhecimento, fruição intelectual, o livro, enquanto objeto, é apenas ‘o suporte da leitura’, o meio pelo qual o escritor chega ao leitor. E assim permanecerá até que ‘alguma coisa similar’ o substitua. Saber quanto tempo essa transição levará para se consumar é mero e certamente inútil exercício de futurologia. Até porque provavelmente não ocorrerá exatamente uma transição, mas apenas a acomodação de uma nova mídia no amplo universo da comunicação. Tem sido assim ao longo da História.
Tranquilizem-se, portanto, os amantes do livro impresso. Tal como ‘a colher, o martelo, a roda ou a tesoura’, ele veio para ficar, pelo menos até onde a vista alcança. E não se desesperem os novidadeiros amantes de gadgets. Estes continuarão sendo inventados e aprimorados por força da voracidade do business globalizado. E é possível até mesmo que algum deles venha a se tornar definitivo e entrar no time do livro, da colher, da roda...
(A. P. Quartim de Moraes. É o fim do livro? Rir para não chorar. www.estadao.com.br/)
PROPOSIÇÃO
Os e-readers, aparelhos de leitura de livros digitalizados, e os chamados tablets, que incorporam outras funções além da leitura de livros e revistas, estão conquistando cada vez mais usuários. Hoje já é possível, com um desses leitores digitais, ter uma biblioteca de milhares de obras e, além disso, acessar para leitura imediata jornais e revistas do mundo inteiro. Diante dessa nova realidade, caracterizada por uma competição muito grande entre empresas que pretendem criar o melhor aparelho eletrônico de leitura, muitos estudiosos já preveem o fim dos jornais e revistas e o fim dos livros. Outros, porém, questionam tais previsões e afirmam que o livro não desaparecerá. Que poderá acontecer de fato?
Com base nos textos apresentados na instrução e, se achar necessário, levando em consideração os textos complementares, escreva uma redação de gênero dissertativo, empregando a norma-padrão, sobre o tema:
O FUTURO DO LIVRO
TEXTOS COMPLEMENTARES
Livros
De livros mil vivo cercado,
Dias e noites passo a ler,
Mas, francamente, o resultado
Coisa não é de agradecer.
Nenhum me dá – paz e conforto,
Nenhum me diz se eu amanhã
Vivo estarei ou se, já morto,
Terá cessado o meu afã.
Nada afinal sabeis ao certo
Sobre das almas o tropel...
Do vosso cume vê-se perto,
Chatas montanhas de papel.
Vãs pretensões! Orgulho fofo!
Do ser mesquinho que voz fez
Tendes o mesmo vil estofo,
Tendes a mesma pequenez.
Cada vez mais, debalde, avulta
Vossa maré... Tudo invadis;
Mas não tornais quem vos consulta
Nem menos mau, nem mais feliz.
Que um cataclismo vos destrua,
Mal não fará... Sem o sentir,
Serena a vida continua:
Lutar, sofrer, sonhar, mentir.
(Afonso Celso. Poesias escolhidas. Rio de Janeiro: H. Garnier Livreiro-Editor, 1904, p. 03-04. Adaptado.)
O livro e a documentação
Nas condições do atual desenvolvimento histórico da humanidade, o conhecimento de primeira mão não pode progredir sem o de segunda mão. Conhecimento de primeira mão é o decorrente, digamos assim, da integração do homem na natureza, para dela haurir continuidade específica e felicidade individual; essa integração, para consolidar-se, foi condicionada pela e condicionou a comunicação verbal, implicadora do conhecimento de segunda mão, a linguagem, no que ela encerra de transmissão cognitiva.Esse conhecimento de segunda mão multiplicou de importância a partir do momento em que o homem pôde mantê-lo em conserva, graficamente, para uso de seus contemporâneos e de seus pósteros. A noosfera, gerando a grafosfera, aumentou os poderes e potências do homem. E hoje a matéria mentada e em conserva gráfica é tão imensa e se renova em ritmo tão intenso, que um dos mais graves problemas da civilização e da cultura humanas é conseguir torná-la relativamente acessível a quantos queiram ou possam acrescentar seu esforço ao herdado das gerações anteriores, na luta pelo aumento do saber, vale dizer, do conhecer, vale dizer, do fazer, vale dizer, do conhecer-fazer-conhecer-fazer, vale dizer, da perpetuação específica e da felicidade individual. Uma “documentação ativa” é condição e imperativo, nesta altura, do progresso. Forma privilegiada da mensagem gráfica, o livro se insere, necessariamente, na documentação, como um dos meios específicos mais poderosos e eficazes da mesma documentação; mas não apenas o livro, é óbvio, senão que quantas coisas realizadas, executadas, interpretadas, achadas, ordenadas, nominadas pelo homem.
(Antonio Houaiss. Elementos de bibliologia. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1967, vol II, p. 36-37.)
Gabarito:
Resolução:
Para ajudar a desenvolver a redação "O futuro do livro", o aluno possuia 3 textos motivadores, , além de outros dois que faziam parte das questões de números 25 a 28 da prova de Linguagens e Códigos, que o ajudavam na compreensão do que era pedido para ser discutido, sendo esses textos:
1. O trecho do texto de Sérgio Luiz Prazo Bellei, no qual ele discute a traumática resposta social que se daria caso o fim do livro fosse possível.
2. Um texto que discute como "as tecnologias digitais ficam obsoletas muito mais rapidamente que o livro impresso". Dessa forma, os livros ainda são ótimas fontes de estudos e pesquisas.
3. Um texto que discute a possibilidade de substituição do livro por outro suporte que possibilite a leitura do texto, quem sabe, de maneira mais fácil e rápida.
Um ponto importante é que independente do ponto de vista defendido pelo candidato, ele poderia, sim, apontar a importância do livro impresso não apenas como uma instituição que possui a missão de “armazenar e fazer circular praticamente todo o conhecimento considerado relevante”, mas também como “uma forma de socialização".
Logo, o tema, com base no que foi dado, levava o candidato a se posicionar, se ele acreditasse na permanência do livro,poderia destacar sua capacidade de preservação de uma quantidade imensa de informações, resistindo ao tempo e as várias tecnologias digitais. que poderiam ter já se tornado obsoletas. Além disso, seria interessante pontuar que os aparelhos eletrônicos para leitura só viriam a ampliar as possibilidade de acesso à leitura, instigando a procura pelos livros impressos.
Contudo, o candidato que duvidasse da perpetuação do livro, ele poderia mencionar a constante inveção e aprimoramento dos aparelhos eletrônicos, os quais estariam conquistando um número maior de adeptos, em decorrência da comodidade oferecida pelo aparelho. Ademais, o candidato poderia argumentar acerca da possibilidade de elaboração, distribuição e utilização do livro de formas antes impossíveis, que agora são potencializadas pela facilidade que a tecnologia oferece.
Por fim, não importa qual fosse o posicionamento adotado, o candidato deveria deixar bem clara sua previsão em relação ao futuro do livro, e não apenas defender sua importância.
(UNESP - 2014 - 1ª FASE)
A questão aborda um poema de Raul de Leoni (1895-1926).
A alma das cousas somos nós...
Dentro do eterno giro universal
Das cousas, tudo vai e volta à alma da gente,
Mas, se nesse vaivém tudo parece igual
Nada mais, na verdade
(5) Nunca mais se repete exatamente...
Sim, as cousas são sempre as mesmas na corrente
Que no-las leva e traz, num círculo fatal;
O que varia é o espírito que as sente
Que é imperceptivelmente desigual,
(10) Que sempre as vive diferentemente,
E, assim, a vida é sempre inédita, afinal...
Estado de alma em fuga pelas horas,
Tons esquivos e trêmulos, nuanças
Suscetíveis, sutis, que fogem no Íris
(15) Da sensibilidade furta-cor...
E a nossa alma é a expressão fugitiva das cousas
E a vida somos nós, que sempre somos outros!...
Homem inquieto e vão que não repousas!
Para e escuta:
(20) Se as cousas têm espírito, nós somos
Esse espírito efêmero das cousas,
Volúvel e diverso,
Variando, instante a instante, intimamente,
E eternamente,
(25) Dentro da indiferença do Universo!...
(Luz mediterrânea, 1965.)
Indique o verso em que ocorre um adjetivo antes e outro depois de um substantivo:
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(Unesp 2014) No último período do texto, os termos saberes e fazeres são
Tablets nas escolas
Ou seja, não é suficiente entregar equipamentos tecnológicos cada vez mais modernos sem uma perspectiva de formação de qualidade e significativa, e sem avaliar os programas anteriores. O risco é de cometer os mesmos equívocos e não potencializar as boas práticas, pois muda a tecnologia, mas as práticas continuam quase as mesmas.
Com isso, podemos nos perguntar pelos desafios da didática diante da cultura digital: o tablet na sala de aula modifica a prática dos professores e o cotidiano escolar? Em que medida ele modifica as condições de aprendizagem dos estudantes? Evidentemente isso pode se desdobrar em inúmeras outras questões sobre a convergência de tecnologias e linguagens, sobre o acesso às redes na sala de aula e sobre a necessidade de mediações na perspectiva dos novos letramentos e alfabetismos nas múltiplas linguagens.
Outra questão que é preciso pensar diz respeito aos conteúdos digitais. Os conteúdos que estão sendo produzidos para os tablets realmente oferecem a potencialidade do meio e sua arquitetura multimídia ou apenas estão servindo como leitores de textos com os mesmos conteúdos dos livros didáticos? Quem está produzindo tais conteúdos digitais? De que forma são escolhidos e compartilhados?
Ou seja, pensar na potencialidade que o tablet oferece na escola — acessar e produzir imagens, vídeos, textos na diversidade de formas e conteúdos digitais — implica em repensar a didática e as possibilidades de experiências e práticas educativas, midiáticas e culturais na escola ao lado de questões econômicas e sociais mais amplas. E isso necessariamente envolve a reflexão crítica sobre os saberes e fazeres que estamos produzindo e compartilhando na cultura digital.
(Tablets nas escolas. www.gazetadopovo.com.br. Adaptado.)
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(UNESP - 2012 - 1a Fase)
Elegia na morte de Clodoaldo Pereira da Silva Moraes, poeta e cidadão
A morte chegou pelo interurbano em longas espirais metálicas.
Era de madrugada. Ouvi a voz de minha mãe, viúva.
De repente não tinha pai.
No escuro de minha casa em Los Angeles procurei recompor tua lembrança
Depois de tanta ausência. Fragmentos da infância
Boiaram do mar de minhas lágrimas. Vi-me eu menino
Correndo ao teu encontro. Na ilha noturna
Tinham-se apenas acendido os lampiões a gás, e a clarineta
De Augusto geralmente procrastinava a tarde.
Era belo esperar-te, cidadão. O bondinho
Rangia nos trilhos a muitas praias de distância...
Dizíamos: “Ê-vem meu pai!”. Quando a curva
Se acendia de luzes semoventes*, ah, corríamos
Corríamos ao teu encontro. A grande coisa era chegar antes
Mas ser marraio** em teus braços, sentir por último
Os doces espinhos da tua barba.
Trazias de então uma expressão indizível de fidelidade e paciência
Teu rosto tinha os sulcos fundamentais da doçura
De quem se deixou ser. Teus ombros possantes
Se curvavam como ao peso da enorme poesia
Que não realizaste. O barbante cortava teus dedos
Pesados de mil embrulhos: carne, pão, utensílios
Para o cotidiano (e frequentemente o binóculo
Que vivias comprando e com que te deixavas horas inteiras
Mirando o mar). Dize-me, meu pai
Que viste tantos anos através do teu óculo de alcance
Que nunca revelaste a ninguém?
Vencias o percurso entre a amendoeira e a casa como o atleta [exausto no último lance da maratona.
Te grimpávamos. Eras penca de filho. Jamais
Uma palavra dura, um rosnar paterno. Entravas a casa humilde
A um gesto do mar. A noite se fechava
Sobre o grupo familial como uma grande porta espessa.
Muitas vezes te vi desejar. Desejavas. Deixavas-te olhando o mar
Com mirada de argonauta. Teus pequenos olhos feios
Buscavam ilhas, outras ilhas... — as imaculadas, inacessíveis
Ilhas do Tesouro. Querias. Querias um dia aportar
E trazer — depositar aos pés da amada as joias fulgurantes
Do teu amor. Sim, foste descobridor, e entre eles
Dos mais provectos***. Muitas vezes te vi, comandante
Comandar, batido de ventos, perdido na fosforência
De vastos e noturnos oceanos
Sem jamais.
Deste-nos pobreza e amor.
A mim me deste
A suprema pobreza: o dom da poesia, e a capacidade de amar
Em silêncio. Foste um pobre. Mendigavas nosso amor
Em silêncio. Foste um no lado esquerdo. Mas
Teu amor inventou. Financiaste uma lancha
Movida a água: foi reta para o fundo. Partiste um dia
Para um brasil além, garimpeiro sem medo e sem mácula.
Doze luas voltaste. Tua primogênita — diz-se —
Não te reconheceu. Trazias grandes barbas e pequenas águas-marinhas.
(Vinicius de Moraes. Antologia poética. 11 ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1974, p. 180-181.)
(*) Semovente: “Que ou o que anda ou se move por si próprio.”
(**) Marraio: “No gude e noutros jogos, palavra que dá, a quem primeiro a grita, o direito de ser o último a jogar.
(***) Provecto: “Que conhece muito um assunto ou uma ciência, experiente, versado, mestre.”
(Dicionário Eletrônico Houaiss)
Em Partiste um dia / Para um brasil além, garimpeiro sem medo e sem mácula., o emprego da palavra brasil com inicial minúscula, no poema de Vinicius, tem a seguinte justificativa:
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(UNESP - 2011 - 1ª FASE) A questão toma por base um fragmento do livro Comunicação e folclore, de Luiz Beltrão (1918-1986).
O Bumba-Meu-Boi
Entre os autos populares conhecidos e praticados no Brasil – pastoril, fandango, chegança, reisado, congada, etc. – aquele em que melhor o povo exprime a sua crítica, aquele que tem maior conteúdo jornalístico, é, realmente, o bumba-meu-boi, ou simplesmente boi.
Para Renato Almeida, é o “bailado mais notável do Brasil, o folguedo brasileiro de maior significação estética e social”. Luís da Câmara Cascudo, por seu turno, observou a sua superioridade porque “enquanto os outros autos cristalizaram, imóveis, no elenco de outrora, o bumba-meu-boi é sempre atual, incluindo soluções modernas, figuras de agora, vocabulário, sensação, percepção contemporânea. Na época da escravidão mostrava os vaqueiros escravos vencendo pela inteligência, astúcia e cinismo. Chibateava a cupidez, a materialidade, o sensualismo de doutores, padres, delegados, fazendo-os cantar versinhos que eram confissões estertóricas. O capitão-do-mato, preador de escravos, assombro dos moleques, faz sono dos negrinhos, vai ‘caçar’ os negros que fugiram, depois da morte do Boi, e em vez de trazê-los é trazido amarrado, humilhado, tremendo de medo. O valentão mestiço, capoeira, apanha pancada e é mais mofino que todos os mofinos. Imaginem a alegria negra, vendo e ouvindo essa sublimação aberta, franca, na porta da casa-grande de engenho ou no terreiro da fazenda, nos pátios das vilas, diante do adro da igreja! A figura dos padres, os padres do interior, vinha arrastada com a violência de um ajuste de contas. O doutor, o curioso, metido a entender de tudo, o delegado autoritário, valente com a patrulha e covarde sem ela, toda a galeria perpassa, expondo suas mazelas, vícios, manias, cacoetes, olhada por uma assistência onde estavam muitas vítimas dos personagens reais, ali subalternizados pela virulência do desabafo”.
Como algumas outras manifestações folclóricas, o bumba-meu- boi utiliza uma forma antiga, tradicional; entretanto, fá-la revestir-se de novos aspectos, atualiza o entrecho, recompõe a trama. Daí “o interesse do tipo solidário que desperta nas camadas populares”, como o assinala Édison Carneiro. Interesse que só pode manter-se porque o que no auto se apresenta não reflete apenas situações do passado, “mas porque têm importância para o futuro”. Com efeito, tendo por tema central a morte e a ressurreição do boi, “cerca-se de episódios acessórios, não essenciais, muito desligados da ação principal, que variam de região para região... em cada lugar, novos personagens são enxertados, aparentemente sem outro objetivo senão o de prolongar e variar a brincadeira”. Contudo, dentre esses personagens, os que representam as classes superiores são caricaturados, cobrindo-se de ridículo, o que torna “o folguedo, em si mesmo, uma reivindicação”.
Sílvio Romero recolheu os versos de um bumba-meu-boi, através dos quais se constata a intenção caricaturesca nos personagens do folguedo. Como o Padre, que recita:
Não sou padre, não sou nada
“Quem me ver estar dançando
Não julgue que estou louco;
Secular sou como os outros”.
Ou como o Capitão-do-Mato que, dando com o negro Fidélis, vai prendê-lo:
“CAPITÃO – Eu te atiro, negro
Eu te amarro, ladrão,
Eu te acabo, cão.”
Mas, ao contrário, quem vai sobre o Capitão e o amarra é o Fidélis:
“CORO – Capitão de campo
Veja que o mundo virou
Foi ao mato pegar negro
Mas o negro lhe amarrou.
CAPITÃO – Sou valente afamado
Como eu não pode haver
Qualquer susto que me fazem
Logo me ponho a correr”.
(Luiz Beltrão. Comunicação e folclore. São Paulo: Edições Melhoramentos, 1971.)
O capitão-do-mato, preador de escravos, assombro dos moleques, faz-sono dos negrinhos, vai ‘caçar’ os negros que fugiram (...).
Nesta passagem, levando-se em conta o contexto, a função sintática e o significado, verifica-se que faz-sono é:
Ver questão