Questão 11519

(ENEM - 2016)

Pirro afirmava que nada é nobre nem vergonhoso, justo ou injusto; e que, da mesma maneira, nada existe do ponto de vista da verdade; que os homens agem apenas segundo a lei e o costume, nada sendo mais isto do que aquilo. Ele levou uma vida de acordo com esta doutrina, nada procurando evitar e não se desviando do que quer que fosse, suportando tudo, carroças, por exemplo, precipícios, cães, nada deixando ao arbítrio dos sentidos.

LAÉRCIO, D. Vidas e sentenças dos filósofos Ilustres. Brasília: Editora UnB, 1988.

O ceticismo, conforme sugerido no texto, caracteriza-se por:

A

Desprezar quaisquer convenções e obrigações da sociedade.

B

 Atingir o verdadeiro prazer como o princípio e o fim da vida feliz.

C

Defender a indiferença e a impossibilidade de obter alguma certeza.

D

Aceitar o determinismo e ocupar-se com a esperança transcendente.

E

Agir de forma virtuosa e sábia a fim de enaltecer o homem bom e belo.

Gabarito:

Defender a indiferença e a impossibilidade de obter alguma certeza.



Resolução:

c) Correta. Defender a indiferença e a impossibilidade de obter alguma certeza.
O ceticismo pode ser caracterizado como a consciência da impossibilidade humana de encontrar verdades universais. O ceticismo pirrônico, uma doutrina de um filósofo do período helenista que concebe a impossibilidade de alcançar a verdade absoluta e, por isso, prescreve um tipo de suspensão de juízo. As doutrinas filosóficas da antiguidade têm um caráter geralmente terapêutico, isto é, visam a felicidade e a tranquilidade da alma; cada uma, ao seu modo, postulou seus princípios. O ceticismo de Pirro também visava estabelcer a tranquilidade da alma a partir da suspensão de juízo, pois observava que a constante busca pela verdade absoluta e definitiva perturbava as pessoas; essa inquietude as lançava em uma impossibilidade, pois, encontrada uma verdade, percebiam a aparência enganosa desta e, perturbadas, lançavam-se novamente à procura de uma nova verdade. O ceticismo pirrônico não objetivava minar essa busca, antes, suspender o juízo acerca dessas verdades, isto é, no encontro de uma, não julgá-la como absoluta e definitiva. Portanto, a investigação deveria permanecer, porém o indivíduo não deveria julgar que o encontro de uma verdade fosse o encontro definitivo com ela, pois esta podia, novamente, ser questionada e provada como uma ilusão.

 

a) Incorreta. Desprezar quaisquer convenções e obrigações da sociedade.
O ceticismo não se configura em desprezo, e sim em descrença, indiferença. O desprezo é uma atitude, uma ação perante a condição de todas as coisas enquanto mera aparência, e foi defendida pelos cínicos, não pelos céticos.

b) Incorreta. Atingir o verdadeiro prazer como o princípio e o fim da vida feliz.
O prazer como princípio e fim da vida feliz é um ideal do epicurismo, não do ceticismo pirrônico, que, de fato, buscava também a felicidade, em conformidade com as propostas terapêuticas da antiguidade, porém por meio da suspensão do juízo.

d) Incorreta. Aceitar o determinismo e ocupar-se com a esperança transcendente.
Para os céticos, o homem não pode alcançar nenhuma certeza sobre a verdade, logo, não existe determinismo. Ademais o determinismo é uma posição típica dos estóicos.

e) Incorreta. Agir de forma virtuosa e sábia a fim de enaltecer o homem bom e belo.
Isso não é levado em conta pelo ideal do ceticismo, mas na Antiguidade Clássica, com Platão e Aristóteles.



Questão 1778

(ENEM - 2015)

Exmº Sr. Governador:

Trago a V. Exa. um resumo dos trabalhos realizados pela Prefeitura de Palmeira dos Índios em 1928.
[...]

ADMINISTRAÇÃO
Relativamente à quantia orçada, os telegramas custaram pouco. De ordinário vai para eles dinheiro considerável. Não há vereda aberta pelos matutos que prefeitura do interior não ponha no arame, proclamando que a coisa foi feita por ela; comunicam-se as datas históricas ao Governo do Estado, que não precisa disso; todos os acontecimentos políticos são badalados. Porque se derrubou a Bastilha - um telegrama; porque se deitou pedra na rua - um telegrama; porque o deputado F. esticou a canela - um telegrama.

Palmeira dos Índios, 10 de janeiro de 1929.
GRACILlANO RAMOS

RAMOS, G. Viventes das Alagoas. São Paulo: Martins Fontes, 1962.

O relatório traz a assinatura de Graciliano Ramos, na época, prefeito de Palmeira dos Índios, e é destinado ao governo do estado de Alagoas. De natureza oficial, o texto chama a atenção por contrariar a norma prevista para esse gênero, pois o autor

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Questão 1781

(ENEM - 2015)

Um dia, meu pai tomou-me pela mão, minha mãe beijou-me a testa, molhando-me de lágrimas os cabelos e eu parti.

Duas vezes fora visitar o Ateneu antes da minha instalação.

Ateneu era o grande colégio da época. Afamado por um sistema de nutrido reclame, mantido por um diretor que de tempos a tempos reformava o estabelecimento, pintando-o jeitosamente de novidade, como os negociantes que liquidam para recomeçar com artigos de última remessa; o Ateneu desde muito tinha consolidado crédito na preferência dos pais, sem levar em conta a simpatia da meninada, a cercar de aclamações o bombo vistoso dos anúncios.

O Dr. Aristarco Argolo de Ramos, da conhecida família do Visconde de Ramos, do Norte, enchia o império com o seu renome de pedagogo. Eram boletins de propaganda pelas províncias, conferências em diversos pontos da cidade, a pedidos, à substância, atochando a imprensa dos lugarejos, caixões, sobretudo, de livros elementares, fabricados às pressas com o ofegante e esbaforido concurso de professores prudentemente anônimos, caixões e mais caixões de volumes cartonados em Leipzig, inundando as escolas públicas de toda a parte com a sua invasão de capas azuis, róseas, amarelas, em que o nome de Aristarco, inteiro e sonoro, oferecia-se ao pasmo venerador dos esfaimados de alfabeto dos confins da pátria. Os lugares que os não procuravam eram um belo dia surpreendidos pela enchente, gratuita, espontânea, irresistível! E não havia senão aceitar a farinha daquela marca para o pão do espírito.

POMPEIA, R. O Ateneu. São Paulo: Scipione, 2005.

Ao descrever o Ateneu e as atitudes de seu diretor, o narrador revela um olhar sobre a inserção social do colégio demarcado pela

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Questão 1782

Primeiro surgiu o homem nu de cabeça baixa. Deus veio num raio. Então apareceram os bichos que comiam os homens. E se fez o fogo, as especiarias, a roupa, a espada e o dever. Em seguida se criou a filosofia, que explicava como não fazer o que não devia ser feito. Então surgiram os números racionais e a História, organizando os eventos sem sentido. A fome desde sempre, das coisas e das pessoas. Foram inventados o calmante e o estimulante. E alguém apagou a luz. E cada um se vira como pode, arrancando as cascas das feridas que alcança.

BONASSI, F. 15 cenas do descobrimento de Brasis. In: MORICONI, I. (Org.). Os cem melhores contos do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

 

A narrativa enxuta e dinâmica de Fernando Bonassi configura um painel evolutivo da história da humanidade. Nele, a projeção do olhar contemporâneo manifesta uma percepção que

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Questão 1783

(ENEM - 2015)

Tudo era harmonioso, sólido, verdadeiro. No princípio. As mulheres, principalmente as mortas do álbum, eram maravilhosas. Os homens, mais maravilhosos ainda, ah, difícil encontrar família mais perfeita. A nossa família, dizia a bela voz de contralto da minha avó. Na nossa família, frisava, lançado em redor olhares complacentes, lamentando os que não faziam parte do nosso clã. [...]

Quando Margarida resolveu contar os podres todos que sabia naquela noite negra da rebelião, fiquei furiosa. [...]

É mentira, é mentira!, gritei tapando os ouvidos. Mas Margarida seguia em frente: tio Maximiliano se casou com a inglesa de cachos só por causa do dinheiro, não passava de um pilantra, a loirinha feiosa era riquíssima. Tia Consuelo? Ora, tia Consuelo chorava porque sentia falta de homem, ela queria homem e não Deus, ou o convento ou o sanatório. O dote era tão bom que o convento abriu-lhe as portas com loucura e tudo. “E tem mais coisas ainda, minha queridinha”, anunciou Margarida fazendo um agrado no meu queixo. Reagi com violência: uma agregada, uma cria e, ainda por cima, mestiça. Como ousava desmoralizar meus heróis?

TELLES, L. F. A estrutura da bolha de sabão. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Representante da ficção contemporânea, a prosa de Lygia Fagundes Telles configura e desconstrói modelos sociais. No trecho, a percepção do núcleo familiar descortina um(a)

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