(UEFS-BA- 2014 - Meio do ano)
TEXTO:
O esforço dos pensadores que nos antecederam deixou pontos de partida muito valiosos. Mas devemos reconhecer que eles nos falaram de um país que, pelo menos em parte, deixou de existir. O Brasil de Gilberto Freyre girava em torno da família extensa da casa-grande, um espaço integrador dentro da monumental desigualdade; o de Sérgio Buarque apenas iniciava a aventura de uma urbanização que prometia associar-se à modernidade e à cidadania; o de Caio Prado mantinha a perspectiva da libertação nacional e do socialismo; o de Celso Furtado era uma economia dinâmica, que experimentava uma acelerada modernização industrial; o de Darcy Ribeiro – cujos ídolos, como sempre dizia, eram Anísio Teixeira e Cândido Rondon – ampliava a escola pública de boa qualidade e recusava o genocídio de suas populações mais fragilizadas.
Os elementos centrais com que todos eles trabalharam foram profundamente alterados nas últimas décadas. A economia mais dinâmica do mundo, que dobrou seu produto, cinco vezes seguidas, em 50 anos, caminha para experimentar a terceira década rastejante. Todos os mecanismos que garantiram mobilidade social na maior parte do século XX foram impiedosamente desmontados, a começar pela escola pública. A urbanização acelerada concentrou multidões desenraizadas, enquanto a desorganização do mercado de trabalho multiplicava excluídos. Tornado refém do sistema financeiro, o Estado nacional deixou de cumprir funções estruturantes essenciais. A fronteira agrícola foi fechada, estabelecendo-se nas áreas de ocupação recente uma estrutura fundiária ainda mais concentrada que a das áreas de ocupação secular. Nessa sociedade urbanizada e estagnada, os meios eletrônicos de comunicação de massa tornaram-se, de longe, a principal instituição difusora de desejos, comportamentos e valores, inoculando diariamente, maciçamente e irresponsavelmente, uma necessidade de consumo desagregadora, pois inacessível. “Nunca foi tão grande a distância entre o que somos e o que poderíamos ser”, disse recentemente Celso Furtado, antes de nos deixar.
Não temos uma teoria do Brasil contemporâneo. Estamos em voo cego, imersos em uma crise de destino, a maior da nossa existência. A História está nos olhando nos olhos, perguntando: “Afinal, o que vocês são? O que querem ser? Tem sentido existir Brasil? Qual Brasil?”.
Temos hesitado em enfrentar questões tão difíceis, tão radicais. Preferimos brincar de macroeconomia. Mas a disjunção está posta: ou o povo brasileiro, movido por uma ideia de si mesmo, assume pela primeira vez o comando de sua nação, para resgatá-la, reinventá-la e desenvolvê-la, ou assistiremos neste século ao desfazimento do Brasil. Se ocorrer esse último desfecho, representará um duríssimo golpe nas melhores promessas da modernidade ocidental e será um retrocesso no processo civilizatório de toda a humanidade. A invenção do futuro se tornará muito mais penosa para todos.
BENJAMIN, César. Uma certa ideia de Brasil. Revista Interesse Nacional. Disponível em: <http://interessenacional.uol.com.br/index.php/edicoesrevista/uma-certa-ideia-de-brasil/>. Acesso em: 6 maio 2014. Adaptado.
Considerando-se a condução do raciocínio argumentativo do articulista, é correto afirmar:
A introdução do texto contextualiza o Brasil do século XX a fim de comparar a realidade apresentada com a atual, mostrando seus avanços e seus entraves.
O primeiro parágrafo apresenta a enumeração dos pensadores do Brasil e de suas ideologias, antecipando ao leitor a problemática que será discutida e sugerindo a má influência desses discursos.
O segundo parágrafo, após constatar as mudanças nas ideologias apresentadas pelos pensadores do século XX, relaciona algumas causas que contribuíram para a realidade enfocada.
O terceiro parágrafo traz um encadeamento de perguntas retóricas, convocando um posicionamento crítico do interlocutor do texto, que é considerado um dos principais agentes do retrocesso civilizatório do país.
O último parágrafo apresenta uma intervenção para a situação-problema, evidenciando, a seguir, duas soluções consideradas possíveis e promissoras para o processo de reinvenção do Brasil e do povo brasileiro.
Gabarito:
O segundo parágrafo, após constatar as mudanças nas ideologias apresentadas pelos pensadores do século XX, relaciona algumas causas que contribuíram para a realidade enfocada.
[C]
Considerando-se a condução do raciocínio argumentativo do articulista, é correto afirmar que o segundo parágrafo, após constatar as mudanças nas ideologias apresentadas pelos pensadores do século XX, relaciona algumas causas que contribuíram para a realidade enfocada.
Os elementos centrais com que todos eles trabalharam foram profundamente alterados nas últimas décadas. A economia mais dinâmica do mundo, que dobrou seu produto, cinco vezes seguidas, em 50 anos, caminha para experimentar a terceira década rastejante. (causa) Todos os mecanismos que garantiram mobilidade social na maior parte do século XX foram impiedosamente desmontados, a começar pela escola pública. (causa) A urbanização acelerada concentrou multidões desenraizadas, enquanto a desorganização do mercado de trabalho multiplicava excluídos. (causa) Tornado refém do sistema financeiro, o Estado nacional deixou de cumprir funções estruturantes essenciais. (causa) A fronteira agrícola foi fechada, estabelecendo-se nas áreas de ocupação recente uma estrutura fundiária ainda mais concentrada que a das áreas de ocupação secular. (causa) Nessa sociedade urbanizada e estagnada, os meios eletrônicos de comunicação de massa tornaram-se, de longe, a principal instituição difusora de desejos, comportamentos e valores, inoculando diariamente, maciçamente e irresponsavelmente, uma necessidade de consumo desagregadora, pois inacessível.”
A alternativa C, portanto, é a correta.
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Com base nessas informações, é correto afirmar:
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