(ENEM - 2019 - PROVA AMARELA)
Um amor desse
Era 24 horas lado a lado
Um radar na pele, aquele sentimento alucinado
Coração batia acelerado
Bastava um olhar pra eu entender
Que era hora de me entregar pra você
Palavras não faziam falta mais
Ah, só de lembrar do seu perfume
Que arrepio, que calafrio
Que o meu corpo sente
Nem que eu queira, eu te apago da minha mente
Ah, esse amor
Deixou marcas no meu corpo
Ah, esse amor
Só de pensar eu grito, eu quase morro
AZEVEDO, N. LEÃO, W. QUADROS, R. Coração pede socorro. Rio de Janeiro, Som Livre, 2018 (fragmento)
Essa letra de canção foi composta especialmente para uma campanha de combate à violência contra as mulheres, buscando conscientizá-las acerca do limite entre relacionamento amoroso e relacionamento abusivo. Para tanto, a estratégia empregada na letra é a
revelação da submissão da mulher à situação de violência, que muitas vezes a leva à morte.
ênfase na necessidade de se ouvirem os apelos da mulher agredida, que continuamente pede socorro.
exploração de situação de duplo sentido que mostra que atos de dominação e violência não configuram amor.
divulgação da importância de denunciar a violência doméstica, que atinge um grande número de mulheres no país.
naturalização de situações opressivas, que fazem parte da vida de mulheres que vivem e uma sociedade patriarcal.
Gabarito:
exploração de situação de duplo sentido que mostra que atos de dominação e violência não configuram amor.
A) INCORRETA: A canção trabalha no plano da ambiguidade, das "entrelinhas", e não de uma revelação, como afirma alternativa. Até o final da letra, não é possível, de forma isolada, compreender os limites entre um "amor intenso" e um "relacionamento abusivo" (distinção estabelecida por dados externos, o veículo e o objetivo).
B) INCORRETA: não é feita uma ênfase nos apelos da mulher agredida, mas a canção está dando um efoque na relação abusiva que se assemelha como um amor, que é na verdade uma violência.
C) CORRETA: A letra de canção “Coração pede socorro” foi composta especialmente para uma campanha de combate à violência contra as mulheres, buscando conscientizá-las acerca do limite entre relacionamento amoroso e relacionamento abusivo. A estratégia empregada na letra, para atingir seu objetivo, é a exploração de um sentido mais denotativo das expressões geralmente vinculadas a uma relação apaixonada: "Coração batia acelerado", "Que arrepio, que calafrio", "Deixou marcas no meu corpo", "Só de pensar eu grito, eu quase morro". Essas, e outras expressões da canção, que poderiam expressar um sentimento positivo e arrebatador exprimem, na realidade, o medo e os abusos psicológicos e físicos sofridos numa realação de abuso, marcando a comumente confundida porém profunda diferença entre relações amorosas e violentas.
“Um amor desse
Era 24 horas lado a lado
Um radar na pele, aquele sentimento alucinado
Coração batia acelerado
[...]
Ah, só de lembrar do seu perfume
Que arrepio, que calafrio
Que o meu corpo sente
Nem que eu queira, eu te apago da minha mente
Ah, esse amor
Deixou marcas no meu corpo
Ah, esse amor
Só de pensar eu grito, eu quase morro”
D) INCORRETA: não se nada sobre a importância de denunciar a violência, mas sim esse é objetivo que a canção quer alcançar. Sabe-se disso porque no texto só fala de como está a relação entre o a mulher e o homem que a abusa, relação essa que é descrita como abusiva.
E) INCORRETA: Essa letra não "naturaliza" a questão do abuso, fazendo justamente o contrário. Ela revela o quão forte pode ser esse laço opressor, e como ele chama a atenção em um relacionamento, devendo ser "desnaturalizado". Afirmar o objetivo de "naturalizar" seria como afirmar que a canção, implicitamente, tem um tom e postura de "comodismo" - sendo que o incômodo é sua principal função conscientizadora.
(ENEM - 2015)
Exmº Sr. Governador:
Trago a V. Exa. um resumo dos trabalhos realizados pela Prefeitura de Palmeira dos Índios em 1928.
[...]
ADMINISTRAÇÃO
Relativamente à quantia orçada, os telegramas custaram pouco. De ordinário vai para eles dinheiro considerável. Não há vereda aberta pelos matutos que prefeitura do interior não ponha no arame, proclamando que a coisa foi feita por ela; comunicam-se as datas históricas ao Governo do Estado, que não precisa disso; todos os acontecimentos políticos são badalados. Porque se derrubou a Bastilha - um telegrama; porque se deitou pedra na rua - um telegrama; porque o deputado F. esticou a canela - um telegrama.
Palmeira dos Índios, 10 de janeiro de 1929.
GRACILlANO RAMOS
RAMOS, G. Viventes das Alagoas. São Paulo: Martins Fontes, 1962.
O relatório traz a assinatura de Graciliano Ramos, na época, prefeito de Palmeira dos Índios, e é destinado ao governo do estado de Alagoas. De natureza oficial, o texto chama a atenção por contrariar a norma prevista para esse gênero, pois o autor
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(ENEM - 2015)
Um dia, meu pai tomou-me pela mão, minha mãe beijou-me a testa, molhando-me de lágrimas os cabelos e eu parti.
Duas vezes fora visitar o Ateneu antes da minha instalação.
Ateneu era o grande colégio da época. Afamado por um sistema de nutrido reclame, mantido por um diretor que de tempos a tempos reformava o estabelecimento, pintando-o jeitosamente de novidade, como os negociantes que liquidam para recomeçar com artigos de última remessa; o Ateneu desde muito tinha consolidado crédito na preferência dos pais, sem levar em conta a simpatia da meninada, a cercar de aclamações o bombo vistoso dos anúncios.
O Dr. Aristarco Argolo de Ramos, da conhecida família do Visconde de Ramos, do Norte, enchia o império com o seu renome de pedagogo. Eram boletins de propaganda pelas províncias, conferências em diversos pontos da cidade, a pedidos, à substância, atochando a imprensa dos lugarejos, caixões, sobretudo, de livros elementares, fabricados às pressas com o ofegante e esbaforido concurso de professores prudentemente anônimos, caixões e mais caixões de volumes cartonados em Leipzig, inundando as escolas públicas de toda a parte com a sua invasão de capas azuis, róseas, amarelas, em que o nome de Aristarco, inteiro e sonoro, oferecia-se ao pasmo venerador dos esfaimados de alfabeto dos confins da pátria. Os lugares que os não procuravam eram um belo dia surpreendidos pela enchente, gratuita, espontânea, irresistível! E não havia senão aceitar a farinha daquela marca para o pão do espírito.
POMPEIA, R. O Ateneu. São Paulo: Scipione, 2005.
Ao descrever o Ateneu e as atitudes de seu diretor, o narrador revela um olhar sobre a inserção social do colégio demarcado pela
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Primeiro surgiu o homem nu de cabeça baixa. Deus veio num raio. Então apareceram os bichos que comiam os homens. E se fez o fogo, as especiarias, a roupa, a espada e o dever. Em seguida se criou a filosofia, que explicava como não fazer o que não devia ser feito. Então surgiram os números racionais e a História, organizando os eventos sem sentido. A fome desde sempre, das coisas e das pessoas. Foram inventados o calmante e o estimulante. E alguém apagou a luz. E cada um se vira como pode, arrancando as cascas das feridas que alcança.
BONASSI, F. 15 cenas do descobrimento de Brasis. In: MORICONI, I. (Org.). Os cem melhores contos do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
A narrativa enxuta e dinâmica de Fernando Bonassi configura um painel evolutivo da história da humanidade. Nele, a projeção do olhar contemporâneo manifesta uma percepção que
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(ENEM - 2015)
Tudo era harmonioso, sólido, verdadeiro. No princípio. As mulheres, principalmente as mortas do álbum, eram maravilhosas. Os homens, mais maravilhosos ainda, ah, difícil encontrar família mais perfeita. A nossa família, dizia a bela voz de contralto da minha avó. Na nossa família, frisava, lançado em redor olhares complacentes, lamentando os que não faziam parte do nosso clã. [...]
Quando Margarida resolveu contar os podres todos que sabia naquela noite negra da rebelião, fiquei furiosa. [...]
É mentira, é mentira!, gritei tapando os ouvidos. Mas Margarida seguia em frente: tio Maximiliano se casou com a inglesa de cachos só por causa do dinheiro, não passava de um pilantra, a loirinha feiosa era riquíssima. Tia Consuelo? Ora, tia Consuelo chorava porque sentia falta de homem, ela queria homem e não Deus, ou o convento ou o sanatório. O dote era tão bom que o convento abriu-lhe as portas com loucura e tudo. “E tem mais coisas ainda, minha queridinha”, anunciou Margarida fazendo um agrado no meu queixo. Reagi com violência: uma agregada, uma cria e, ainda por cima, mestiça. Como ousava desmoralizar meus heróis?
TELLES, L. F. A estrutura da bolha de sabão. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.
Representante da ficção contemporânea, a prosa de Lygia Fagundes Telles configura e desconstrói modelos sociais. No trecho, a percepção do núcleo familiar descortina um(a)
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