(ENEM - 2016 - 2ª aplicação)
Os que fiam e tecem unem e ordenam materiais dispersos que, de outro modo, seriam vãos ou quase. Pertencem à mesma linhagem FIANDEIRA CARNEIRO FUSO LÃ dos geômetras, estabelecem leis e pontos de união para o desuno. Antes do fuso, da roca, do tear, das invenções destinadas a estender LÃ LINHO CASULO ALGODÃO LÃ os fios e cruzá-los, o algodão, a seda, era como se ainda estivessem TECEDEIRA URDIDURA TEAR LÃ imersos no limbo, nas trevas do informe. É o apelo à ordem que os traz à claridade, transforma-os em obras, portanto em objetos humanos, iluminados pelo espírito do homem. Não é por ser-nos úteis LÃ TRAMA CROCHÊ DESENHO LÃ que o burel ou o linho representam uma vitória do nosso engenho; TAPECElRA BASTIDOR ROCA LÃ sim por serem tecidos, por cantar neles uma ordem, o sereno, o firme e rigoroso enlace da urdidura, das linhas enredadas. Assim é que LÃ COSER AGULHA CAPUCHO LÃ que suas expressões mais nobres são aquelas em que, com ainda maior disciplina, floresce o ornamento: no crochê, no tapete, FIANDEIRA CARNEIRO FUSO LÃ no brocado. Então, é como se por uma espécie de alquimia, de álgebra, de mágica, algodoais e Carneiros, casulos, LÃ TRAMA CASULO CAPUCHO LÃ campos de linho, novamente surgissem, com uma vida menos rebelde, porém mais perdurável.
LINS, O. Nove, novena: narrativas. São Paulo: Cia. das Letras, 1998.
No trecho, retirado do conto Retábulo de Santa Joana Carolina, de Osman Lins, a fim de expressar uma ideia relativa à literatura, o autor emprega um procedimento singular de escrita, que consiste em
entremear o texto com termos destacados que se referem ao universo do tecer e remetem visualmente à estrutura de uma trama, tecida com fios que retornam periodicamente, para aludir ao trabalho do escritor.
entrecortar a progressão do texto com termos destacados, sem relação com o contexto, que tornam evidente a desordem como princípio maior da sua proposta literária.
insinuar, pela disposição de termos destacados, dos quais um forma uma coluna central no corpo do texto, que a atividade de escrever remete à arte ornamental do escultor.
dissertar à maneira de um cientista sobre os fenômenos da natureza, recriminando-a por estar perpetuamente em desordem e não criar concatenação entre eles.
confrontar, por meio dos termos destacados, o ato de escrever à atividade dos cientistas modernos e dos alquimistas antigos, mostrando que esta é muito superior à do escritor.
Gabarito:
entremear o texto com termos destacados que se referem ao universo do tecer e remetem visualmente à estrutura de uma trama, tecida com fios que retornam periodicamente, para aludir ao trabalho do escritor.
A imagem do texto escrito como uma “trama” de palavras é tradicional, revisitada no fragmento de Osmar Lins através dos substantivos em caixa alta interpolados ao texto, todos do campo semântico da tecelagem.
(ENEM - 2015)
Exmº Sr. Governador:
Trago a V. Exa. um resumo dos trabalhos realizados pela Prefeitura de Palmeira dos Índios em 1928.
[...]
ADMINISTRAÇÃO
Relativamente à quantia orçada, os telegramas custaram pouco. De ordinário vai para eles dinheiro considerável. Não há vereda aberta pelos matutos que prefeitura do interior não ponha no arame, proclamando que a coisa foi feita por ela; comunicam-se as datas históricas ao Governo do Estado, que não precisa disso; todos os acontecimentos políticos são badalados. Porque se derrubou a Bastilha - um telegrama; porque se deitou pedra na rua - um telegrama; porque o deputado F. esticou a canela - um telegrama.
Palmeira dos Índios, 10 de janeiro de 1929.
GRACILlANO RAMOS
RAMOS, G. Viventes das Alagoas. São Paulo: Martins Fontes, 1962.
O relatório traz a assinatura de Graciliano Ramos, na época, prefeito de Palmeira dos Índios, e é destinado ao governo do estado de Alagoas. De natureza oficial, o texto chama a atenção por contrariar a norma prevista para esse gênero, pois o autor
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(ENEM - 2015)
Um dia, meu pai tomou-me pela mão, minha mãe beijou-me a testa, molhando-me de lágrimas os cabelos e eu parti.
Duas vezes fora visitar o Ateneu antes da minha instalação.
Ateneu era o grande colégio da época. Afamado por um sistema de nutrido reclame, mantido por um diretor que de tempos a tempos reformava o estabelecimento, pintando-o jeitosamente de novidade, como os negociantes que liquidam para recomeçar com artigos de última remessa; o Ateneu desde muito tinha consolidado crédito na preferência dos pais, sem levar em conta a simpatia da meninada, a cercar de aclamações o bombo vistoso dos anúncios.
O Dr. Aristarco Argolo de Ramos, da conhecida família do Visconde de Ramos, do Norte, enchia o império com o seu renome de pedagogo. Eram boletins de propaganda pelas províncias, conferências em diversos pontos da cidade, a pedidos, à substância, atochando a imprensa dos lugarejos, caixões, sobretudo, de livros elementares, fabricados às pressas com o ofegante e esbaforido concurso de professores prudentemente anônimos, caixões e mais caixões de volumes cartonados em Leipzig, inundando as escolas públicas de toda a parte com a sua invasão de capas azuis, róseas, amarelas, em que o nome de Aristarco, inteiro e sonoro, oferecia-se ao pasmo venerador dos esfaimados de alfabeto dos confins da pátria. Os lugares que os não procuravam eram um belo dia surpreendidos pela enchente, gratuita, espontânea, irresistível! E não havia senão aceitar a farinha daquela marca para o pão do espírito.
POMPEIA, R. O Ateneu. São Paulo: Scipione, 2005.
Ao descrever o Ateneu e as atitudes de seu diretor, o narrador revela um olhar sobre a inserção social do colégio demarcado pela
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Primeiro surgiu o homem nu de cabeça baixa. Deus veio num raio. Então apareceram os bichos que comiam os homens. E se fez o fogo, as especiarias, a roupa, a espada e o dever. Em seguida se criou a filosofia, que explicava como não fazer o que não devia ser feito. Então surgiram os números racionais e a História, organizando os eventos sem sentido. A fome desde sempre, das coisas e das pessoas. Foram inventados o calmante e o estimulante. E alguém apagou a luz. E cada um se vira como pode, arrancando as cascas das feridas que alcança.
BONASSI, F. 15 cenas do descobrimento de Brasis. In: MORICONI, I. (Org.). Os cem melhores contos do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
A narrativa enxuta e dinâmica de Fernando Bonassi configura um painel evolutivo da história da humanidade. Nele, a projeção do olhar contemporâneo manifesta uma percepção que
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(ENEM - 2015)
Tudo era harmonioso, sólido, verdadeiro. No princípio. As mulheres, principalmente as mortas do álbum, eram maravilhosas. Os homens, mais maravilhosos ainda, ah, difícil encontrar família mais perfeita. A nossa família, dizia a bela voz de contralto da minha avó. Na nossa família, frisava, lançado em redor olhares complacentes, lamentando os que não faziam parte do nosso clã. [...]
Quando Margarida resolveu contar os podres todos que sabia naquela noite negra da rebelião, fiquei furiosa. [...]
É mentira, é mentira!, gritei tapando os ouvidos. Mas Margarida seguia em frente: tio Maximiliano se casou com a inglesa de cachos só por causa do dinheiro, não passava de um pilantra, a loirinha feiosa era riquíssima. Tia Consuelo? Ora, tia Consuelo chorava porque sentia falta de homem, ela queria homem e não Deus, ou o convento ou o sanatório. O dote era tão bom que o convento abriu-lhe as portas com loucura e tudo. “E tem mais coisas ainda, minha queridinha”, anunciou Margarida fazendo um agrado no meu queixo. Reagi com violência: uma agregada, uma cria e, ainda por cima, mestiça. Como ousava desmoralizar meus heróis?
TELLES, L. F. A estrutura da bolha de sabão. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.
Representante da ficção contemporânea, a prosa de Lygia Fagundes Telles configura e desconstrói modelos sociais. No trecho, a percepção do núcleo familiar descortina um(a)
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