Questão 28691

(ENEM - 2015)  

A pátria

Ama, com fé e orgulho, a terra em que nasceste!
Criança! não verás nenhum país como este!
Olha que céu! que mar! que rios! que floresta!
A Natureza, aqui, perpetuamente em festa,
É um seio de mãe a transbordar carinhos.
Vê que vida há no chão! vê que vida há nos ninhos,
Que se balançam no ar, entre os ramos inquietos!
Vê que luz, que calor, que multidão de insetos!
Vê que grande extensão de matas, onde impera,
Fecunda e luminosa, a eterna primavera!
Boa terra! jamais negou a quem trabalha
O pão que mata a fome, o teto que agasalha...

Quem com o seu suor a fecunda e umedece,
Vê pago o seu esforço, e é feliz, e enriquece!

Criança! não verás país nenhum como este:
Imita na grandeza a terra em que nasceste!
 

BILAC, O. Poesias infantis. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1929.

Publicado em 1904, o poema A pátria harmoniza-se com um projeto ideológico em construção na Primeira República. O discurso poético de Olavo Bilac ecoa esse projeto, na medida em que

A

a paisagem natural ganha contornos surreais, como o projeto brasileiro de grandeza.   

B

a prosperidade individual, como a exuberância da terra, independe de políticas de governo.   

C

os valores afetivos atribuídos à família devem ser aplicados também aos ícones nacionais.

D

a capacidade produtiva da terra garante ao país a riqueza que se verifica naquele momento.   

E

a valorização do trabalhador passa a integrar o conceito de bem-estar social experimentado.   

Gabarito:

a prosperidade individual, como a exuberância da terra, independe de políticas de governo.   



Resolução:

A) INCORRETA: porque há apenas uma exaltação das belezas naturais presentes no Brasil e não está vinculado a nenhum projeto de grandeza. Tais descrições feitos pelo eu-lírico em relação a beleza natural do Brasil são independentes de medidas governamentais, visto que no Brasil prevalece a “eterna primavera".

B) CORRETA: Olavo Bilac escreveu esse poema na época da, então recente, República. Esta fundada nos princípios expressos em nossa bandeira: Ordem e Progresso. De cunho positivista, a República foi implementada sobre um ideal progressista, de unificação do povo (portanto nacionalista), com um cunho autoritário. Em "Pátria", Bilac evidencia o ideário de progresso da época e relaciona as riquezas naturais de nosso país como algo para se inspirar. 

C) INCORRETA: Mesmo que haja uma comparação entre a pátria e o seio materno, o ponto de confluência entre as ideias governamentais e as ideias de Bilac está sintetizado nessa relação de soberania absoluta da terra como exemplo ao indivíduo. Não há menção a "ícones", mas sim a representação de uma abundância que, autossuficiente, é capaz de "cuidar" também dos cidadãos e deve servir de exemplo ("Criança! não verás país nenhum como este:/ Imita na grandeza a terra em que nasceste!"). 

D) INCORRETA: porque não responde aquilo que a questão demanda e com um desvio histórico, mas não se preocupe, vou lhe explicar o porquê. A princípio, precisamos analisar os objetivos da Primeira República, o ano em que foi publicado esse poema e a contextualização histórica pela qual passava o Brasil naquele momento. Sobre os objetivos republicanos, observamos que desde à Proclamação da República até esse momento havia o interesse de modoficar os detentores do poder (dos monárquicos para as oligarquias, as elites agrárias), mas mantendo a beleza e importância do país. No entanto, pela contextualização histórica dessa época, vemos que o país enfretava uma grave crise, que depois iria ser reeforçada pela Crise Mundial de 1929, mas que se baseava na divisão do poder. Então, naquela época o país não era tão próspero quanto os republicanos esperavam e então o país não tinha tanta riqueza como a alternativa afirma. Mas, da mesma forma, o poema de Bilac quer mostrar que, apesar disso tudo, o país tem riquezas internas que sobrevivem e independem de qualquer governo, riquezas essas que partem da terra e de cada pessoa individualmente. 

E) INCORRETA: a valorização do trabalhador como parte do conceito de bem-estar não estava presente no projeto ideológico da Primeira República, mais focada na consolidação do senso de nação brasileira. A valorização mais imperativa do trabalhador veio a ocorrer somente na década de 1930, com a criação das leis trabalhistas por Getúlio Vargas.



Questão 1778

(ENEM - 2015)

Exmº Sr. Governador:

Trago a V. Exa. um resumo dos trabalhos realizados pela Prefeitura de Palmeira dos Índios em 1928.
[...]

ADMINISTRAÇÃO
Relativamente à quantia orçada, os telegramas custaram pouco. De ordinário vai para eles dinheiro considerável. Não há vereda aberta pelos matutos que prefeitura do interior não ponha no arame, proclamando que a coisa foi feita por ela; comunicam-se as datas históricas ao Governo do Estado, que não precisa disso; todos os acontecimentos políticos são badalados. Porque se derrubou a Bastilha - um telegrama; porque se deitou pedra na rua - um telegrama; porque o deputado F. esticou a canela - um telegrama.

Palmeira dos Índios, 10 de janeiro de 1929.
GRACILlANO RAMOS

RAMOS, G. Viventes das Alagoas. São Paulo: Martins Fontes, 1962.

O relatório traz a assinatura de Graciliano Ramos, na época, prefeito de Palmeira dos Índios, e é destinado ao governo do estado de Alagoas. De natureza oficial, o texto chama a atenção por contrariar a norma prevista para esse gênero, pois o autor

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Questão 1781

(ENEM - 2015)

Um dia, meu pai tomou-me pela mão, minha mãe beijou-me a testa, molhando-me de lágrimas os cabelos e eu parti.

Duas vezes fora visitar o Ateneu antes da minha instalação.

Ateneu era o grande colégio da época. Afamado por um sistema de nutrido reclame, mantido por um diretor que de tempos a tempos reformava o estabelecimento, pintando-o jeitosamente de novidade, como os negociantes que liquidam para recomeçar com artigos de última remessa; o Ateneu desde muito tinha consolidado crédito na preferência dos pais, sem levar em conta a simpatia da meninada, a cercar de aclamações o bombo vistoso dos anúncios.

O Dr. Aristarco Argolo de Ramos, da conhecida família do Visconde de Ramos, do Norte, enchia o império com o seu renome de pedagogo. Eram boletins de propaganda pelas províncias, conferências em diversos pontos da cidade, a pedidos, à substância, atochando a imprensa dos lugarejos, caixões, sobretudo, de livros elementares, fabricados às pressas com o ofegante e esbaforido concurso de professores prudentemente anônimos, caixões e mais caixões de volumes cartonados em Leipzig, inundando as escolas públicas de toda a parte com a sua invasão de capas azuis, róseas, amarelas, em que o nome de Aristarco, inteiro e sonoro, oferecia-se ao pasmo venerador dos esfaimados de alfabeto dos confins da pátria. Os lugares que os não procuravam eram um belo dia surpreendidos pela enchente, gratuita, espontânea, irresistível! E não havia senão aceitar a farinha daquela marca para o pão do espírito.

POMPEIA, R. O Ateneu. São Paulo: Scipione, 2005.

Ao descrever o Ateneu e as atitudes de seu diretor, o narrador revela um olhar sobre a inserção social do colégio demarcado pela

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Questão 1782

Primeiro surgiu o homem nu de cabeça baixa. Deus veio num raio. Então apareceram os bichos que comiam os homens. E se fez o fogo, as especiarias, a roupa, a espada e o dever. Em seguida se criou a filosofia, que explicava como não fazer o que não devia ser feito. Então surgiram os números racionais e a História, organizando os eventos sem sentido. A fome desde sempre, das coisas e das pessoas. Foram inventados o calmante e o estimulante. E alguém apagou a luz. E cada um se vira como pode, arrancando as cascas das feridas que alcança.

BONASSI, F. 15 cenas do descobrimento de Brasis. In: MORICONI, I. (Org.). Os cem melhores contos do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

 

A narrativa enxuta e dinâmica de Fernando Bonassi configura um painel evolutivo da história da humanidade. Nele, a projeção do olhar contemporâneo manifesta uma percepção que

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Questão 1783

(ENEM - 2015)

Tudo era harmonioso, sólido, verdadeiro. No princípio. As mulheres, principalmente as mortas do álbum, eram maravilhosas. Os homens, mais maravilhosos ainda, ah, difícil encontrar família mais perfeita. A nossa família, dizia a bela voz de contralto da minha avó. Na nossa família, frisava, lançado em redor olhares complacentes, lamentando os que não faziam parte do nosso clã. [...]

Quando Margarida resolveu contar os podres todos que sabia naquela noite negra da rebelião, fiquei furiosa. [...]

É mentira, é mentira!, gritei tapando os ouvidos. Mas Margarida seguia em frente: tio Maximiliano se casou com a inglesa de cachos só por causa do dinheiro, não passava de um pilantra, a loirinha feiosa era riquíssima. Tia Consuelo? Ora, tia Consuelo chorava porque sentia falta de homem, ela queria homem e não Deus, ou o convento ou o sanatório. O dote era tão bom que o convento abriu-lhe as portas com loucura e tudo. “E tem mais coisas ainda, minha queridinha”, anunciou Margarida fazendo um agrado no meu queixo. Reagi com violência: uma agregada, uma cria e, ainda por cima, mestiça. Como ousava desmoralizar meus heróis?

TELLES, L. F. A estrutura da bolha de sabão. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Representante da ficção contemporânea, a prosa de Lygia Fagundes Telles configura e desconstrói modelos sociais. No trecho, a percepção do núcleo familiar descortina um(a)

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