Questão 59596

 (ENEM - 2020 - PROVA AMARELA)

Slam do Corpo é um encontro pensado para surdos e ouvintes, existente desde 2014, em São Paulo. Uma iniciativa pioneira do grupo Corposinalizante, criado em 2008. (Antes de seguirmos, vale a explicação: o termo slam vem do inglês e significa - numa nova acepção para o verbo geralmente utilizado para dizer "bater com força" - a "poesia falada nos ritmos das palavras e da cidade").Nos saraus, o primeiro objetivo foi o de botar os poemas em Libras na roda, colocar os surdos para circular e entender esse encontro entre a poesia e a língua de sinais, compreender o encontro dessas duas línguas. Poemas de autoria própria, três minutos, um microfone. Sem figurino, nem adereços, nem acompanhamento musical. O que vale é moular a voz e o corpo, um trabalho artesanal de tornar a palavra "visível", numa arena cujo objetivo maior é o de emocionar a plateia, tirar o público da passividade, seja pelo humor, horror, caos, doçura e outras tantas sensações.

NOVELLI, G. Poesia incorporada. Revista Continente, n. 189, set. 2016 (adaptado).

Na prática artística mencionada no texto, o corpo assume papel de destaque ao articular diferentes linguagens com o intuito de

A

imprimir ritmo e visibilidade à expressão poética.

B

redefinir o espaço de circulação da poesia urbana.

C

estimular produções autorais de usuários de Libras.

D

traduzir expressões verbais para a língua de sinais.

E

proporcionar performances estéticas de pessoas surdas.

Gabarito:

imprimir ritmo e visibilidade à expressão poética.



Resolução:

A) CORRETA: porque o intuito do Slam de Corpo é justamente colocar no movimento uma espécie de ritmo para que os objetivos poéticos sejam alcançados. Enquanto na poesia verbal os mecanismos utilizados são da ordem da sonorização (rima, versificação, ritmo), no Slam de Corpo os mecanismos são voltados para o movimento (ritmo do corpo, balanço, expressão corporal, etc.). Dessa forma, está sendo impressa o ritmo e visibilidade para que os objetivos poéticos sejam alcançados nessa modalidade.

B) INCORRETA: porque é falado de uma "redefinição do espaço de circulação da poesia urbana", mas esse espaço não é o foco dessa modalidade artística, porque outras modalidades (como a poesia acústica, a poesia de cartaz, etc.) já assumem essa função. O mais correto seria a "redefinição do público", verdadeiro objetivo dessa poesia, que visa o público-alvo de surdos, mas também de ouvintes

C) INCORRETA: não se objetiva somente que haja mais produção artística de usuários de Libras, mas sim que os surdos sejam incluídos em um espaço que antes era tido só para ouvintes. O Slam do Corpo objetiva mobilizar movimentos corporais e a voz, não para que a comunidade surda comece a produzir arte, mas para que eles estejam incluídos nas artes já existentes.

D) INCORRETA: por conta do uso da palavra "traduzir", pois essa palavra, segundo alguns historiadores, possui inteiramente uma ideia de transcodage, isto é, fazer a passagem das ideias presentes em um material para o outro de língua totalmente diferente. Mas esse não é propósito do Slam do Corpo, porque essa modalidade, segundo o próprio texto, "é um encontro pensado para surdos e ouvintes", ou seja, toda a expressão produzida não vem da expressão verbal, mas é feita especialmente para esse público, tendo um caráter de criação próprio.

E) INCORRETA: pensando no texto como um todo, podemos perceber que o conteúdo da alternativa é limitante, uma vez que reduz a apresentação das pessoas surdas ao movimento corporal. O texto, por sua vez, indica que elas usam sua voz também para se expressar, como fica claro no trecho: "O que vale é moular a voz e o corpo, um trabalho artesanal de tornar a palavra "visível".



Questão 1778

(ENEM - 2015)

Exmº Sr. Governador:

Trago a V. Exa. um resumo dos trabalhos realizados pela Prefeitura de Palmeira dos Índios em 1928.
[...]

ADMINISTRAÇÃO
Relativamente à quantia orçada, os telegramas custaram pouco. De ordinário vai para eles dinheiro considerável. Não há vereda aberta pelos matutos que prefeitura do interior não ponha no arame, proclamando que a coisa foi feita por ela; comunicam-se as datas históricas ao Governo do Estado, que não precisa disso; todos os acontecimentos políticos são badalados. Porque se derrubou a Bastilha - um telegrama; porque se deitou pedra na rua - um telegrama; porque o deputado F. esticou a canela - um telegrama.

Palmeira dos Índios, 10 de janeiro de 1929.
GRACILlANO RAMOS

RAMOS, G. Viventes das Alagoas. São Paulo: Martins Fontes, 1962.

O relatório traz a assinatura de Graciliano Ramos, na época, prefeito de Palmeira dos Índios, e é destinado ao governo do estado de Alagoas. De natureza oficial, o texto chama a atenção por contrariar a norma prevista para esse gênero, pois o autor

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Questão 1781

(ENEM - 2015)

Um dia, meu pai tomou-me pela mão, minha mãe beijou-me a testa, molhando-me de lágrimas os cabelos e eu parti.

Duas vezes fora visitar o Ateneu antes da minha instalação.

Ateneu era o grande colégio da época. Afamado por um sistema de nutrido reclame, mantido por um diretor que de tempos a tempos reformava o estabelecimento, pintando-o jeitosamente de novidade, como os negociantes que liquidam para recomeçar com artigos de última remessa; o Ateneu desde muito tinha consolidado crédito na preferência dos pais, sem levar em conta a simpatia da meninada, a cercar de aclamações o bombo vistoso dos anúncios.

O Dr. Aristarco Argolo de Ramos, da conhecida família do Visconde de Ramos, do Norte, enchia o império com o seu renome de pedagogo. Eram boletins de propaganda pelas províncias, conferências em diversos pontos da cidade, a pedidos, à substância, atochando a imprensa dos lugarejos, caixões, sobretudo, de livros elementares, fabricados às pressas com o ofegante e esbaforido concurso de professores prudentemente anônimos, caixões e mais caixões de volumes cartonados em Leipzig, inundando as escolas públicas de toda a parte com a sua invasão de capas azuis, róseas, amarelas, em que o nome de Aristarco, inteiro e sonoro, oferecia-se ao pasmo venerador dos esfaimados de alfabeto dos confins da pátria. Os lugares que os não procuravam eram um belo dia surpreendidos pela enchente, gratuita, espontânea, irresistível! E não havia senão aceitar a farinha daquela marca para o pão do espírito.

POMPEIA, R. O Ateneu. São Paulo: Scipione, 2005.

Ao descrever o Ateneu e as atitudes de seu diretor, o narrador revela um olhar sobre a inserção social do colégio demarcado pela

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Questão 1782

Primeiro surgiu o homem nu de cabeça baixa. Deus veio num raio. Então apareceram os bichos que comiam os homens. E se fez o fogo, as especiarias, a roupa, a espada e o dever. Em seguida se criou a filosofia, que explicava como não fazer o que não devia ser feito. Então surgiram os números racionais e a História, organizando os eventos sem sentido. A fome desde sempre, das coisas e das pessoas. Foram inventados o calmante e o estimulante. E alguém apagou a luz. E cada um se vira como pode, arrancando as cascas das feridas que alcança.

BONASSI, F. 15 cenas do descobrimento de Brasis. In: MORICONI, I. (Org.). Os cem melhores contos do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

 

A narrativa enxuta e dinâmica de Fernando Bonassi configura um painel evolutivo da história da humanidade. Nele, a projeção do olhar contemporâneo manifesta uma percepção que

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Questão 1783

(ENEM - 2015)

Tudo era harmonioso, sólido, verdadeiro. No princípio. As mulheres, principalmente as mortas do álbum, eram maravilhosas. Os homens, mais maravilhosos ainda, ah, difícil encontrar família mais perfeita. A nossa família, dizia a bela voz de contralto da minha avó. Na nossa família, frisava, lançado em redor olhares complacentes, lamentando os que não faziam parte do nosso clã. [...]

Quando Margarida resolveu contar os podres todos que sabia naquela noite negra da rebelião, fiquei furiosa. [...]

É mentira, é mentira!, gritei tapando os ouvidos. Mas Margarida seguia em frente: tio Maximiliano se casou com a inglesa de cachos só por causa do dinheiro, não passava de um pilantra, a loirinha feiosa era riquíssima. Tia Consuelo? Ora, tia Consuelo chorava porque sentia falta de homem, ela queria homem e não Deus, ou o convento ou o sanatório. O dote era tão bom que o convento abriu-lhe as portas com loucura e tudo. “E tem mais coisas ainda, minha queridinha”, anunciou Margarida fazendo um agrado no meu queixo. Reagi com violência: uma agregada, uma cria e, ainda por cima, mestiça. Como ousava desmoralizar meus heróis?

TELLES, L. F. A estrutura da bolha de sabão. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Representante da ficção contemporânea, a prosa de Lygia Fagundes Telles configura e desconstrói modelos sociais. No trecho, a percepção do núcleo familiar descortina um(a)

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