(FUVEST - 2011 - 1ª fase)
Todo o barbeiro é tagarela, e principalmente quando tem pouco que fazer; começou portanto a puxar conversa com o freguês. Foi a sua salvação e fortuna.
O navio a que o marujo pertencia viajava para a Costa e ocupava-se no comércio de negros; era um dos combóis que traziam fornecimento para o Valongo, e estava pronto a largar.
— Ó mestre! disse o marujo no meio da conversa, você também não é sangrador?
— Sim, eu também sangro...
— Pois olhe, você estava bem bom, se quisesse ir conosco... para curar 1a gente a bordo; morre-se ali que é uma praga.
— 2Homem, eu da cirurgia não entendo 3muito...
— Pois já não disse que sabe também sangrar?
— Sim...
— Então já sabe até demais.
No dia seguinte 4saiu o nosso homem pela barra fora: a 6fortuna tinha-lhe dado o meio, cumpria sabê-lo aproveitar; de oficial de barbeiro dava um salto mortal a médico de navio negreiro; restava unicamente saber fazer render a nova posição. Isso ficou por sua conta.
Por um feliz acaso logo nos primeiros dias de viagem adoeceram dois marinheiros; chamou-se o médico; ele fez tudo o que sabia... sangrou os doentes, e em pouco tempo estavam bons, perfeitos. Com isto ganhou imensa reputação, e começou a ser estimado.
Chegaram com feliz viagem ao seu destino; tomaram o seu carregamento de gente, e voltaram para o Rio. Graças à 5lanceta do nosso homem, nem um só negro morreu, o que muito contribuiu para aumentar-lhe a sólida reputação de entendedor do riscado.
Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um sargento de milícias.
Das seguintes afirmações acerca de diferentes elementos linguísticos do texto, a única correta é:
A expressão sublinhada em “para curar a gente a bordo” (ref. 1) deve ser entendida como pronome de tratamento de uso informal.
A fórmula de tratamento (ref. 2) com que o barbeiro se dirige ao marujo mantém o tom cerimonioso do início do diálogo.
O destaque gráfico da palavra “muito” (ref. 3) produz um efeito de sentido que é reforçado pelas reticências.
O pronome possessivo usado nos trechos “saiu o nosso homem” (ref. 4) e “lanceta do nosso homem” (ref. 5) configura o chamado plural de modéstia.
A palavra “fortuna”, tal como foi empregada (ref.6), pode ser substituída por “bens”, sem prejuízo para o sentido.
Gabarito:
O destaque gráfico da palavra “muito” (ref. 3) produz um efeito de sentido que é reforçado pelas reticências.
A expressão sublinhada em “para curar a gente a bordo” (ref. 1) deve ser entendida como pronome de tratamento de uso informal.Comentário: alternativa incorreta.Pois o pronome de tratamento de uso informal que é encontrado no fragmento "a gente" não é considerado como um elemento linguístico diferenciado no texto.( essa alternativa ao meu ver pode ser plausível para ser correta, porém o gabarito oficial não a considera com a correta).
A fórmula de tratamento (ref. 2) com que o barbeiro se dirige ao marujo mantém o tom cerimonioso do início do diálogo.Comentário: alternativa incorreta.Pois no fragmento "Homem, eu da cirurgia não entendo" não há destaque cerimonioso, mas apenas um chamamento.
O destaque gráfico da palavra “muito” (ref. 3) produz um efeito de sentido que é reforçado pelas reticências.Comentário: alternativa correta.Pois a frase em questão constitui um caso de lítotes, figura de linguagem em que se nega o contrário do que se quer afirmar. Com efeito, “não entendo muito...” significa, no contexto, “entendo pouco” com mesmo sentido de “não entendo nada”
O pronome possessivo usado nos trechos “saiu o nosso homem” (ref. 4) e “lanceta do nosso homem” (ref. 5) configura o chamado plural de modéstia.Comentário: alternativa incorreta.Pois o plural de modéstia é utilizado apenas para enfatizar quem escreve ou fala se referindo a si próprio usando a primeira pessoa do plural em vez de usar a primeira pessoa do singular, no caso do exemplo, há apenas o destaque de "nosso homem" como uma figura de destaque do leitor.
A palavra “fortuna”, tal como foi empregada (ref.6), pode ser substituída por “bens”, sem prejuízo para o sentido.Comentário: alternativa incorreta.Pois a palavra "fortuna" não pode ser substituída por "bens", porque ao utilizar esse termo apresenta um sentido de posse de bens que pode ser materiais ou imateriais, porém não implicam a um valor exorbitante, que representa uma elevada condição financeira. O termo adequado para a substituição é "riqueza".
(FUVEST - 2016 - 1ª FASE)
No contexto do cartum, a presença de numerosos animais de estimação permite que o juízo emitido pela personagem seja considerado
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(FUVEST - 2016 - 1ª FASE)
Para obter o efeito de humor presente no cartum, o autor se vale, entre outros, do seguinte recurso:
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(Fuvest 2016)
Omolu espalhara a bexiga na cidade. Era uma vingança contra a cidade dos ricos. Mas os ricos tinham a vacina, que sabia Omolu de vacinas? Era um pobre deus das florestas d’África. Um deus dos negros pobres. Que podia saber de vacinas? Então a bexiga desceu e assolou o povo de Omolu. Tudo que Omolu pôde fazer foi transformar a bexiga de negra em alastrim, bexiga branca e tola. Assim mesmo morrera negro, morrera pobre. Mas Omolu dizia que não fora o alastrim que matara. Fora o 1lazareto. Omolu só queria com o alastrim marcar seus filhinhos negros. O lazareto é que os matava. Mas as macumbas pediam que ele levasse a bexiga da cidade, levasse para os ricos latifundiários do sertão. Eles tinham dinheiro, léguas e léguas de terra, mas não sabiam tampouco da vacina. O Omolu diz que vai pro sertão. E os negros, os ogãs, as filhas e pais de santo cantam:
Ele é mesmo nosso pai
e é quem pode nos ajudar...
Omolu promete ir. Mas para que seus filhos negros não o esqueçam avisa no seu cântico de despedida:
Ora, adeus, ó meus filhinhos,
Qu’eu vou e torno a vortá...
E numa noite que os atabaques batiam nas macumbas, numa noite de mistério da Bahia, Omolu pulou na máquina da Leste Brasileira e foi para o sertão de Juazeiro. A bexiga foi com ele.
Jorge Amado, Capitães da Areia.
1lazareto: estabelecimento para isolamento sanitário de pessoas atingidas por determinadas doenças.
Costuma-se reconhecer que Capitães da Areia pertence ao assim chamado “romance de 1930”, que registra importantes transformações pelas quais passava o Modernismo no Brasil, à medida que esse movimento se expandia e diversificava. No excerto, considerado no contexto do livro de que faz parte, constitui marca desse pertencimento
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(Fuvest 2012)
Como não expressa visão populista nem elitista, o livro não idealiza os pobres e rústicos, isto é, não oculta o dano causado pela privação, nem os representa como seres desprovidos de vida interior; ao contrário, o livro trata de realçar, na mente dos desvalidos, o enlace estreito e dramático de limitação intelectual e esforço reflexivo.
Essas afirmações aplicam-se ao modo como, na obra:
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