Questão 60226

(FUVEST - 2021 - 2 fase)

Leia o texto para responder à questão.

   Nessa mesma noite, leu-lhe o artigo que advertia o partido da conveniência de não ceder às perfídias do poder apoiando em algumas províncias certa gente corrupta e sem valor. Eis que a conclusão:

   "Os partidos devem ser uniddos e disciplinados. Há quem pretenda (mirabile dictu!*) que essa disciplina e união não podem ir ao ponto de rejeitar os benefícios que caem das mãos dos adversários. Risum teneatis!** Quem pode proferir tal blasfêmia sem que lhe tremam as carnes? Mas suponhamos que assim seja, que a oposição possa, uma ou outra vez, fechar os olhos aos desmandos do governo, à postergação das leis, aos excessos da autoridade, à perversidade e aos sofismas. Quid inde?*** Tais casos - aliás, raros, - só podiam ser admitidos quando favorecessem os elementos bons, não os maus. Cada partido tem os seus díscolos e sicofantas. É interesse dos nosso adversários ver-nos afrouxar, a troco da animação dada à parte corrupta do partido. Esta é a verdade; negá-lo é provocar-nos guerra intestina, isto é, à dilaceração da alma nacional...Mas, não, as ideias não morrem; elas são o lábaro da justiça. Os vendilhões serão expulsos do templo; ficarão os crentes e os puros, os que pôem acima dos interesses mesquinhos, locais e passageiros a vitória indefectível dos princípios. Tudo que não for isto ter-nos-á contra si. Alea jacta est****".

(...)

   Rubião aplaudu o artigo; achava-o excelente. Talvez poucco enérgico. Vendilhões,  por exemplo, era bem dito; mas ficava melhor vis vendilhões.

- Vis vendilhões? Há só um inconveniente, ponderou Camacho. É a repetição dos vv. Vis vem... Vis vendilhões; não sente que o som fica desagradável?

- Mas lá em cima há vés vis...

- Vae victis. Mas é uma frase latina. Podemos arranjar outra coisa: vis mercadores.

- Vis mercadores é bom.

- Contudo, mercadores não tem a força de vendilhões.

- Então, por que não deixa vendilhões? Vis vendilhões é forete, ninguém repara no som. Olhe, eu nunca dou por isso. Gosto de energia. Vis vendilhões.

Machado de Assis, Quincas Borba

 

*"Coisa admirável de dizer." **"Contereis o riso." ***"O que então?" ****"A sorte está lançada."

a) Segundo Camacho, os partidos possuem entre os seus membros "díscolos e sicofantas", isto é, dissidentes e caluniadores. De que modo a retórica do político constitui um artifícil para persuadir seu ouvinte quanto aos erros de alguns correligionários?

b) A expressão latina Vae victis! ("Ai dos vencidos!") lembra ao leitor a máxima da filosofia que Quincas Borba apresenta a Rubião no início do romance. Como essas duas frases se contrapõem na trajetória do protagonista?

Gabarito:

Resolução:

a) Camacho, em Quincas Borba, é um político do partido de oposição que, como vários outros personagens, revela-se um grande oportunista. Sua retórica corrobora com essa intenção oportunista, ao buscar um rebuscamento sofismático, que leva o discurso à ambiguidade, com palavras difíceis e tortuosas, a fim de convencer o ouvinte de argumentos falsos. Na fala em questão, o orador afirma que a “dissidência” de membros de seu partido não necessariamente indica que eles estejam indo contra os ideais defendidos pelo partido de oposição, mas este pensamento pode ser considerado errado, pois Camacho quer dizer que não tem muita importância haver dissidentes, desde que estes sejam boas pessoas, bons políticos. Assim, podemos concluir que a oposição pode ser comprada em troca de certos privilégios, compondo e apoiando o governo, indo contra os princípios que defendiam quando estavam na oposição, mas para Camacho isto não conta como uma traição, apesar de ser um comportamento claramente escuso.

b) A citação latina (“Ai dos vencidos”) e a máxima “humanitista” do filósofo (“Ao vencedor, as batatas!”) constituem um binômio que, no romance, se reflete nas ações e destinos de Rubião. Isso porque o protagonista ocupa as duas posições: a de vencedor e a de vencido. Ao receber a herança e experimentar uma expressiva ascensão social, Rubião é humanitas, um vencedor que recebe do mundo suas batatas e caminha na direção do sucesso e da sobrevivência social. Diferente do previsto na filosofia, entretanto, a história desse vencedor se converte numa derrota: atraiçoado por Cristiano Palha, Sofia e outros personagens, Rubião assiste à própria falência material e psíquica, que o leva ao miserável fim, pobre e demente, vencido.



Questão 1779

(FUVEST - 2016 - 1ª FASE)

No contexto do cartum, a presença de numerosos animais de estimação permite que o juízo emitido pela personagem seja considerado

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Questão 1780

(FUVEST - 2016 - 1ª FASE)

Para obter o efeito de humor presente no cartum, o autor se vale, entre outros, do seguinte recurso:

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Questão 1794

(Fuvest 2016)

Omolu espalhara a bexiga na cidade. Era uma vingança contra a cidade dos ricos. Mas os ricos tinham a vacina, que sabia Omolu de vacinas? Era um pobre deus das florestas d’África. Um deus dos negros pobres. Que podia saber de vacinas? Então a bexiga desceu e assolou o povo de Omolu. Tudo que Omolu pôde fazer foi transformar a bexiga de negra em alastrim, bexiga branca e tola. Assim mesmo morrera negro, morrera pobre. Mas Omolu dizia que não fora o alastrim que matara. Fora o 1lazareto. Omolu só queria com o alastrim marcar seus filhinhos negros. O lazareto é que os matava. Mas as macumbas pediam que ele levasse a bexiga da cidade, levasse para os ricos latifundiários do sertão. Eles tinham dinheiro, léguas e léguas de terra, mas não sabiam tampouco da vacina. O Omolu diz que vai pro sertão. E os negros, os ogãs, as filhas e pais de santo cantam:

Ele é mesmo nosso pai
e é quem pode nos ajudar...

Omolu promete ir. Mas para que seus filhos negros não o esqueçam avisa no seu cântico de despedida:

Ora, adeus, ó meus filhinhos,
Qu’eu vou e torno a vortá...

E numa noite que os atabaques batiam nas macumbas, numa noite de mistério da Bahia, Omolu pulou na máquina da Leste Brasileira e foi para o sertão de Juazeiro. A bexiga foi com ele.

Jorge Amado, Capitães da Areia.

1lazareto: estabelecimento para isolamento sanitário de pessoas atingidas por determinadas doenças.

Costuma-se reconhecer que Capitães da Areia pertence ao assim chamado “romance de 1930”, que registra importantes transformações pelas quais passava o Modernismo no Brasil, à medida que esse movimento se expandia e diversificava. No excerto, considerado no contexto do livro de que faz parte, constitui marca desse pertencimento

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Questão 1804

(Fuvest 2012)

Como não expressa visão populista nem elitista, o livro não idealiza os pobres e rústicos, isto é, não oculta o dano causado pela privação, nem os representa como seres desprovidos de vida interior; ao contrário, o livro trata de realçar, na mente dos desvalidos, o enlace estreito e dramático de limitação intelectual e esforço reflexivo. 

Essas afirmações aplicam-se ao modo como, na obra:

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