(FUVEST - 2010 - 1ª FASE)
Desde pequeno, tive tendência para personificar as coisas. Tia Tula, que achava que mormaço fazia mal, sempre gritava: “Vem pra dentro, menino, olha o mormaço!” Mas eu ouvia o mormaço com M maiúsculo. Mormaço, para mim, era um velho que pegava crianças! Ia pra dentro logo. E ainda hoje, quando leio que alguém se viu perseguido pelo clamor público, vejo com estes olhos o Sr. Clamor Público, magro, arquejante, de preto, brandindo um guarda-chuva, com um gogó protuberante que se abaixa e levanta no excitamento da perseguição. E já estava devidamente grandezinho, pois devia contar uns trinta anos, quando me fui, com um grupo de colegas, a ver o lançamento da pedra fundamental da ponte Uruguaiana-Libres, ocasião de grandes solenidades, com os presidentes Justo e Getúlio, e gente muita, tanto assim que fomos alojados os do meu grupo num casarão que creio fosse a Prefeitura, com os demais jornalistas do Brasil e Argentina. Era como um alojamento de quartel, com breve espaço entre as camas e todas as portas e janelas abertas, tudo com os alegres incômodos e duvidosos encantos de uma coletividade democrática. Pois lá pelas tantas da noite, como eu pressentisse, em meu entredormir, um vulto junto à minha cama, sentei-me estremunhado* e olhei atônito para um tipo de chiru*, ali parado, de bigodes caídos, pala pendente e chapéu descido sobre os olhos. Diante da minha muda interrogação, ele resolveu explicar-se, com a devida calma: Pois é! Não vê que eu sou o sereno...
Mário Quintana, As cem melhores crônicas brasileiras.
*Glossário: estremunhado: mal acordado. chiru: que ou aquele que tem pele morena, traços acaboclados (regionalismo: Sul do Brasil).
No início do texto, o autor declara sua “tendência para personificar as coisas”. Tal tendência se manifesta na personificação dos seguintes elementos:
Tia Tula, Justo e Getúlio.
mormaço, clamor público, sereno.
magro, arquejante, preto.
colegas, jornalistas, presidentes.
vulto, chiru, crianças.
Gabarito:
mormaço, clamor público, sereno.
A) INCORRETA: pois “Tia Tula”, “Justo” e “Getúlio” já são nomes direcionados a pessoas específicas, e não a transformação de outras palavras em nomes.
B) CORRETA: elementos como “mormaço”, “clamor público” e “sereno”, por si só, indicam as coisas no mundo, mas não se referem naturalmente a pessoas. No entanto, vemos que no texto há essa referência: “mormaço para mim era um velho”, “Sr. Clamor Público” e “eu sou o sereno”.
C) INCORRETA: pois as três palavras, “magro”, “arquejante” e “preto” são, na sua natureza e no seu uso dentro do texto, palavras que expressam caracterizações, e não nominações.
D) INCORRETA: pois essas três palavras são, por si só, palavras que nomeiam as pessoas e as personificam no espaço-tempo, então seu uso não demonstra o desejo de personificar as pessoas.
E) INCORRETA: pois essas três palavras são, por si só, palavras que nomeiam as pessoas e as personificam no espaço-tempo, então seu uso não demonstra o desejo de personificar as pessoas.
(FUVEST - 2016 - 1ª FASE)
No contexto do cartum, a presença de numerosos animais de estimação permite que o juízo emitido pela personagem seja considerado
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(FUVEST - 2016 - 1ª FASE)
Para obter o efeito de humor presente no cartum, o autor se vale, entre outros, do seguinte recurso:
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(Fuvest 2016)
Omolu espalhara a bexiga na cidade. Era uma vingança contra a cidade dos ricos. Mas os ricos tinham a vacina, que sabia Omolu de vacinas? Era um pobre deus das florestas d’África. Um deus dos negros pobres. Que podia saber de vacinas? Então a bexiga desceu e assolou o povo de Omolu. Tudo que Omolu pôde fazer foi transformar a bexiga de negra em alastrim, bexiga branca e tola. Assim mesmo morrera negro, morrera pobre. Mas Omolu dizia que não fora o alastrim que matara. Fora o 1lazareto. Omolu só queria com o alastrim marcar seus filhinhos negros. O lazareto é que os matava. Mas as macumbas pediam que ele levasse a bexiga da cidade, levasse para os ricos latifundiários do sertão. Eles tinham dinheiro, léguas e léguas de terra, mas não sabiam tampouco da vacina. O Omolu diz que vai pro sertão. E os negros, os ogãs, as filhas e pais de santo cantam:
Ele é mesmo nosso pai
e é quem pode nos ajudar...
Omolu promete ir. Mas para que seus filhos negros não o esqueçam avisa no seu cântico de despedida:
Ora, adeus, ó meus filhinhos,
Qu’eu vou e torno a vortá...
E numa noite que os atabaques batiam nas macumbas, numa noite de mistério da Bahia, Omolu pulou na máquina da Leste Brasileira e foi para o sertão de Juazeiro. A bexiga foi com ele.
Jorge Amado, Capitães da Areia.
1lazareto: estabelecimento para isolamento sanitário de pessoas atingidas por determinadas doenças.
Costuma-se reconhecer que Capitães da Areia pertence ao assim chamado “romance de 1930”, que registra importantes transformações pelas quais passava o Modernismo no Brasil, à medida que esse movimento se expandia e diversificava. No excerto, considerado no contexto do livro de que faz parte, constitui marca desse pertencimento
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(Fuvest 2012)
Como não expressa visão populista nem elitista, o livro não idealiza os pobres e rústicos, isto é, não oculta o dano causado pela privação, nem os representa como seres desprovidos de vida interior; ao contrário, o livro trata de realçar, na mente dos desvalidos, o enlace estreito e dramático de limitação intelectual e esforço reflexivo.
Essas afirmações aplicam-se ao modo como, na obra:
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