Questão 36472

(FUVEST - 2016 - 2ª fase)

Leia este texto.

Mas o meu novíssimo amigo, debruçado da janela, batia as palmas como Catão para chamar os servos, na Roma simples. E gritava:

- Ana Vaqueira! Um copo de água, bem lavado, da fonte velha!

Pulei, imensamente divertido:

- Oh Jacinto! E as águas carbonatadas? E as fosfatadas? E as esterilizadas? E as sódicas?...

O meu Príncipe atirou os ombros com um desdém soberbo. E aclamou a aparição de um grande copo, todo embaciado pela frescura nevada da água refulgente, que uma bela moça trazia num prato. Eu admirei sobretudo a moça... Que olhos, de um negro tão líquido e sério! No andar, no quebrar da cinta, que harmonia e que graça de ninfa latina!

E apenas pela porta desaparecera a esplêndida aparição:

- Oh Jacinto, eu daqui a um instante também quero água! E se compete a esta rapariga trazer as coisas, eu, de cinco em cinco minutos, quero uma coisa!... Que olhos, que corpo... Caramba, menino! Eis a poesia, toda viva, da serra...

O meu Príncipe sorria, com sinceridade:

- Não! Não nos iludamos, Zé Fernandes, nem façamos Arcádia. É uma bela moça, mas uma bruta... Não há ali mais poesia, nem mais sensibilidade, nem mesmo mais beleza do que numa linda vaca turina. Merece o seu nome de Ana Vaqueira. Trabalha bem, digere bem, concebe bem. Para isso a fez a Natureza, assim sã e rija (...).

Eça de Queirós, A cidade e as serras

 

a) No período em que Jacinto passa a viver na serra, tornam-se relativamente frequentes, no romance, as referências à cultura da Antiguidade Clássica. Consideradas no contexto da obra, o que conotam as referências que o narrador, no excerto, faz a aspectos dessa cultura?

b) Considerando-a no contexto em que aparece, explique a expressão “nem façamos Arcádia”, empregada por Jacinto

Gabarito:

Resolução:

a) A saída da cidade em direção ao campo, no caso do romance, às serras, é uma tópica associada aos valores da Arcádia, ou seja, um país ideal, lírico e bucólico criado no contexto da antiguidade. Para o protagonista, Jacinto, apenas a saída da convulsão urbana (fugere urbem) e a possibilidade de conexão com a natureza (locus amoenus) representa a possibilidade humanística de restituição que, na história da literatura e do pensamento ociedntal, está fortemente vinculada aos símbolos e realidades greco-romanos. O ímpeto árcade da personagem eciana traz ao romance uma discussão simultaneamente literário-filosófica, associada aos valores estéticos e humanos e sua desconfiguração, e político-social, ao tratar da reação do indivíduo diante das pungentes transformações, morais e físicas, da realidade que o circunda. 

b) A irônica colocação de Jacinto faz referência ao ideal da Arcádia, terra antiga de sublimes musas, comparável ao Paraíso. Para ele, mesmo que o bucólico lugarejo de Tormes seja mais próximo desse ideal que a convulsa Paris, ele e o amigo não devem criar ilusões e idealizar a nova vida. Tal ironia é posteriormente comprovada com a constatação de que ana Vaqueira está distante dos ideais estéticos das musas gregas e é, como era de se esperar na zona rural portuguesa, uma "bruta". 



Questão 1779

(FUVEST - 2016 - 1ª FASE)

No contexto do cartum, a presença de numerosos animais de estimação permite que o juízo emitido pela personagem seja considerado

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Questão 1780

(FUVEST - 2016 - 1ª FASE)

Para obter o efeito de humor presente no cartum, o autor se vale, entre outros, do seguinte recurso:

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Questão 1794

(Fuvest 2016)

Omolu espalhara a bexiga na cidade. Era uma vingança contra a cidade dos ricos. Mas os ricos tinham a vacina, que sabia Omolu de vacinas? Era um pobre deus das florestas d’África. Um deus dos negros pobres. Que podia saber de vacinas? Então a bexiga desceu e assolou o povo de Omolu. Tudo que Omolu pôde fazer foi transformar a bexiga de negra em alastrim, bexiga branca e tola. Assim mesmo morrera negro, morrera pobre. Mas Omolu dizia que não fora o alastrim que matara. Fora o 1lazareto. Omolu só queria com o alastrim marcar seus filhinhos negros. O lazareto é que os matava. Mas as macumbas pediam que ele levasse a bexiga da cidade, levasse para os ricos latifundiários do sertão. Eles tinham dinheiro, léguas e léguas de terra, mas não sabiam tampouco da vacina. O Omolu diz que vai pro sertão. E os negros, os ogãs, as filhas e pais de santo cantam:

Ele é mesmo nosso pai
e é quem pode nos ajudar...

Omolu promete ir. Mas para que seus filhos negros não o esqueçam avisa no seu cântico de despedida:

Ora, adeus, ó meus filhinhos,
Qu’eu vou e torno a vortá...

E numa noite que os atabaques batiam nas macumbas, numa noite de mistério da Bahia, Omolu pulou na máquina da Leste Brasileira e foi para o sertão de Juazeiro. A bexiga foi com ele.

Jorge Amado, Capitães da Areia.

1lazareto: estabelecimento para isolamento sanitário de pessoas atingidas por determinadas doenças.

Costuma-se reconhecer que Capitães da Areia pertence ao assim chamado “romance de 1930”, que registra importantes transformações pelas quais passava o Modernismo no Brasil, à medida que esse movimento se expandia e diversificava. No excerto, considerado no contexto do livro de que faz parte, constitui marca desse pertencimento

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Questão 1804

(Fuvest 2012)

Como não expressa visão populista nem elitista, o livro não idealiza os pobres e rústicos, isto é, não oculta o dano causado pela privação, nem os representa como seres desprovidos de vida interior; ao contrário, o livro trata de realçar, na mente dos desvalidos, o enlace estreito e dramático de limitação intelectual e esforço reflexivo. 

Essas afirmações aplicam-se ao modo como, na obra:

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