(FUVEST - 2022 - 1ª FASE)
Chega um momento em que a tensão eu/mundo se exprime mediante uma perspectiva crítica, imanente à escrita, o que torna o romance não mais uma variante literária da rotina social, mas o seu avesso; logo, o oposto do discurso ideológico do homem médio. O romancista “imitaria” a vida, sim, mas qual vida? Aquela cujo sentido dramático escapa a homens e mulheres entorpecidos ou automatizados por seus hábitos cotidianos. A vida como objeto de busca e construção, e não a vida como encadeamento de tempos vazios e inertes. Caso essa pobre vida- morte deva ser tematizada, ela aparecerá como tal, degradada, sem a aura positiva com que as palavras “realismo” e “realidade” são usadas nos discursos que fazem a apologia conformista da “vida como ela é”... A escrita da resistência, a narrativa atravessada pela tensão crítica, mostra, sem retórica nem alarde ideológico, que essa “vida como ela é” é, quase sempre, o ramerrão de um mecanismo alienante, precisamente o contrário da vida plena e digna de ser vivida.
É nesse sentido que se pode dizer que a narrativa descobre a vida verdadeira, e que esta abraça e transcende a vida real. A literatura, com ser ficção, resiste à mentira. É nesse horizonte que o espaço da literatura, considerado em geral como lugar da fantasia, pode ser o lugar da verdade mais exigente.
Alfredo Bosi. “Narrativa e resistência”. Adaptado.
O conceito de resistência, expresso pela tensão do indivíduo perante o mundo, adquire perspectiva crítica na escrita do romance quando o autor
rompe a superfície enganosa da realidade.
forja um realismo rente à vida mesquinha.
é neutro ao figurar a vacuidade do presente.
conserva o discurso positivo da ordem.
consegue sobrepor a fantasia à verdade.
Gabarito:
rompe a superfície enganosa da realidade.
A) CORRETA: quando o autor de um texto escreve elementos da realidade, mas acrescenta situações narrativas para agregar à sua escrita, vemos que ele foge da mera descrição da realidade (situações realizadas em outros gêneros, como os jornalísticos). Dessa forma, é apresentado que a realidade é mais profunda do que aquilo que ela aparenta ser, visão essa alcançada por meio da relação dos elementos verídicos com construções narrativas criadas pelo autor.
B) INCORRETA: o autor não forja um “realismo”, mas acresce aos elementos reais que estão sendo descritos possíveis elementos fictícios e impressões diversas que fazem com que a escrita fuja de uma mera descrição real da “vida com ela é”.
C) INCORRETA: ainda que muitos textos sejam escritos em terceira pessoa, o autor ainda assim não é neutro. Isso porque ele direciona seu leitor a uma impressão do texto específica, algo já discutido por muitos especialistas (como Antônio Cândido, em A morte do autor). O autor é, portanto, determinante.
D) INCORRETA: porque o autor de um texto não faz somente a descrição da ordem que a vida real segue, mas acrescenta elementos narrativos que fazem com que o texto escrito fuja da monotonicidade que a vida tem. Essa fuga pode ser representada por elementos de desordem ao longo da narrativa.
E) INCORRETA: não se pode dizer que todos os autores escrevem textos que sobrepõem a fantasia em detrimento da verdade. Isso porque muitos deles fazem um equilíbrio: apresentam elementos verídicos no seu texto, mas, para que eles não sejam entediantes, apresentam na mesma medida elementos fantasiosos.
(FUVEST - 2016 - 1ª FASE)
No contexto do cartum, a presença de numerosos animais de estimação permite que o juízo emitido pela personagem seja considerado
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(FUVEST - 2016 - 1ª FASE)
Para obter o efeito de humor presente no cartum, o autor se vale, entre outros, do seguinte recurso:
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(Fuvest 2016)
Omolu espalhara a bexiga na cidade. Era uma vingança contra a cidade dos ricos. Mas os ricos tinham a vacina, que sabia Omolu de vacinas? Era um pobre deus das florestas d’África. Um deus dos negros pobres. Que podia saber de vacinas? Então a bexiga desceu e assolou o povo de Omolu. Tudo que Omolu pôde fazer foi transformar a bexiga de negra em alastrim, bexiga branca e tola. Assim mesmo morrera negro, morrera pobre. Mas Omolu dizia que não fora o alastrim que matara. Fora o 1lazareto. Omolu só queria com o alastrim marcar seus filhinhos negros. O lazareto é que os matava. Mas as macumbas pediam que ele levasse a bexiga da cidade, levasse para os ricos latifundiários do sertão. Eles tinham dinheiro, léguas e léguas de terra, mas não sabiam tampouco da vacina. O Omolu diz que vai pro sertão. E os negros, os ogãs, as filhas e pais de santo cantam:
Ele é mesmo nosso pai
e é quem pode nos ajudar...
Omolu promete ir. Mas para que seus filhos negros não o esqueçam avisa no seu cântico de despedida:
Ora, adeus, ó meus filhinhos,
Qu’eu vou e torno a vortá...
E numa noite que os atabaques batiam nas macumbas, numa noite de mistério da Bahia, Omolu pulou na máquina da Leste Brasileira e foi para o sertão de Juazeiro. A bexiga foi com ele.
Jorge Amado, Capitães da Areia.
1lazareto: estabelecimento para isolamento sanitário de pessoas atingidas por determinadas doenças.
Costuma-se reconhecer que Capitães da Areia pertence ao assim chamado “romance de 1930”, que registra importantes transformações pelas quais passava o Modernismo no Brasil, à medida que esse movimento se expandia e diversificava. No excerto, considerado no contexto do livro de que faz parte, constitui marca desse pertencimento
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(Fuvest 2012)
Como não expressa visão populista nem elitista, o livro não idealiza os pobres e rústicos, isto é, não oculta o dano causado pela privação, nem os representa como seres desprovidos de vida interior; ao contrário, o livro trata de realçar, na mente dos desvalidos, o enlace estreito e dramático de limitação intelectual e esforço reflexivo.
Essas afirmações aplicam-se ao modo como, na obra:
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